‘Still Alive For The Growth’, o salto para a maturidade dos Lotus Fever
A febre de Lótus, originária da flor de Lótus, significa, segundo a sabedoria hindu indiana, pureza espiritual. A febre deriva da pureza do espírito, da entrega na espiritualidade do vulgo, humano. Os Lotus Fever são uma banda de rock alternativo/psicadélico que anda por cá desde 2014, ano em que lançaram o primeiro CD Search For Meaning. Sem querer encontrar uma justificação que fale da justiça à injustiça do trato desde maravilhoso álbum, só a partir de 2015/2016 esta singular banda começou a ter a merecida atenção pelo público, tocando em circuitos mais abertos, como por exemplo no Bélem Art Fest (2015) e no Palco Coreto no Festival NOS Alive (2016).
Na 4ª feira foi a primeira vez que tivemos o prazer de ouvir ao vivo o segundo brilhante CD dos Lotus Fever, Still Alive For The Growth. O quarteto dos jovens (que já foram velhos e não sabem) esteve em palco com uma presença incrivelmente madura. Pedro Zuzarte (voz e guitarra), Diogo Teixeira de Abreu (baterista), Bernardo Afonso (teclas), Manuel Siqueira (guitarra), posicionaram-se no palco do MusicBox com as divisórias entre cada um claramente definidas. O Pedro assumiu o comando daquela voz, que lhe surge numa espécie de nascente de água cristalina. Brinca com ela dando-lhe as voltas que quer, e o mais incrível, suspende-a em tempos infinitos numa doçura de tal forma macia que nos obriga várias vezes a fechar os olhos e a ficar inteiros com ela.
“Messed Up Honor” é a primeira faixa de “Still alive for the growth”, e a vénia de abertura ficou a cargo das guitarras elétricas. Alinhamento inteligente, em que intercalam temas do primeiro CD Search for Meaning e o novo álbum. “Into the light”, “Introspection”, Mild Temptations”, “Currently”, e as duas do encore “Collapse “ e “Together”.
“Dogs and Bones”, é o single do novo álbum. A base das teclas sustenta os acordes suaves das guitarras e a bateria dá a batida certa para durante uns momentos tudo seguir um caminho em harmonia. Como em quase todas as músicas, quando julgamos que vamos gingar os ombros até ao final, surge um acorde a rasgar o caminho e faz estremecer a melodia durante uns momentos, para depois se acertar com a harmonia e voltar ao início.
Still Alive For The Growth é um álbum, acima de tudo, de canções de alerta para as problemáticas sociais e ambientais mais actuais. “ Animal Farm”, com texto retirado do romance homónimo do escritor inglês nascido na India, George Orwell, foi um dos momentos altos do concerto. “10.000 People” (“Ten thousand people dancing through the rain/Thinking about the disilusion they became”), onde acompanhamos a serenidade introspectiva das vozes e dos samplers.
Quase no final, a música que dá nome ao álbum dispara com os arranjos mais desalinhados, com algumas passagens a fazerem lembrar o primeiro álbum, com pequenas influências de Pink Floyd. No encore, dois temas fortes do primeiro álbum “Collapse” e “Together” em que deixam o público, que era bastante, a dançar e a cantar (“Together”). Fica apenas a nota de que poderiam ter passado alguns videoclipes da banda, nomeadamente o fabuloso “Animal Farm”, de produção e edição de Maria Bianchi e dos próprios.
Os Lotus Fever deram um salto significativo do primeiro para o segundo álbum. Como é comum nestes processos, numa primeira fase os trabalhos discográficos espelham muitas vezes as influências musicais. A prova da autenticidade surge no segundo álbum; ou continuam colados às influências ou criam um novo caminho identitário onde possam posicionar-se de forma única no panorama musical. A qualidade sempre foi uma característica intrínseca desta banda, mas com este álbum, os Lotus Fever estruturam criativamente e com maturidade a sua identidade. Únicos.