O conhecimento do Holocausto em Portugal
Este artigo faz parte de um conjunto de três (o primeiro e o terceiro) sobre a temática de Portugal na Segunda Guerra Mundial, e é fruto de um trabalho de investigação realizado para uma unidade curricular da Universidade.
Neste segundo artigo, irei explicar como e quando é que o conhecimento do Holocausto chegou à sociedade portuguesa, e também ao, na altura, presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar.
O Holocausto iniciou-se em meados de junho de 1941, com a Operação Barbarrosa, e terminaria entre abril ou maio de 1945, com a invasão das tropas Aliadas. Para além de judeus, também houve violência de massas a ciganos, eslavos ou homossexuais, ainda que não tenha tido comparação com o que aconteceu à comunidade judaica dos países ocupados pelos nazis.
Cronologicamente, ainda antes da prática de extermínio judeu por parte da Alemanha nazi, surgiu em junho de 1940, no jornal O Século, “notícias sobre as perseguições movidas pelos alemães contra os judeus”, ou seja, apesar da Censura, este tipo de informações do que se passava na Europa ia chegando ao conhecimento da população alfabetizada portuguesa.
Terá sido, em finais de 1941, que Salazar soube pela primeira vez dos “crimes de guerra perpetrados pelos alemães e pelos romenos contra os judeus”, através da carta do diplomata português em Bucareste, que dava conta da perseguição e extermínio de judeus, sendo que o ditador romeno Ion Antonescu considerava tais atos aceitáveis porque, segundo ele, os judeus teriam sido os culpados dos crimes contra os romenos durante a ocupação soviética e, portanto, o seu assassínio seria justo, sendo que também considerava que a maioria dos romenos era a favor destas práticas.
No início do ano de 1942, António de Oliveira Salazar recebeu uma carta dos Serviços de Censura, O jornal A Voz pretendia publicar uma notícia que referia que “«a pena recusa-se a escrever o que contam os relatórios polacos a respeito da exterminação das crianças daquele desventurado país»”. Por serem atribuídas aos alemães responsabilidades dessas práticas, e por serem extremamente graves, a Censura considerou essas passagens “«fantasiosas, ou pelo menos exageradas»”, e não permitiu a sua publicação.
Em junho de 1942, as rádios e jornais de vários países começaram a difundir “informação explícita sobre os crimes dos nazis contra os judeus nos países da Europa ocupada”. A 24 de novembro desse mesmo ano, Stephan Wise, presidente do Congresso Judaico Mundial, havia fornecido informações a alguns jornais sobre “o assassinato em massa dos judeus pelos nazis”, tendo também referido a utilização de “gás para o seu extermínio e também os locais onde estavam sediados os campos de extermínio.
Após os Estados Unidos da América confirmarem a veracidade destas informações, divulgou-as, no dia 17 de dezembro de 1942, pelos países ocidentais, incluindo os neutrais, onde se incluía Portugal. A partir desta altura, “já não era possível alegar desconhecimento quanto ao assassinato perpetrado na Europa”.
Contudo, estas notícias não alteraram a posição de Salazar, que continuava a considerar que Portugal deveria ser apenas, e quando possível, um país de passagem, e não de fixação de judeus perseguidos. Para além disso, exigiu que o “custear das despesas com os refugiados judeus fosse assegurado pela Comunidade Israelita de Lisboa ou por organizações estrangeiras”.
Em 1945, surgiram algumas notícias sobre o extermínio de judeus por parte da Alemanha. No dia 10 de junho, por exemplo, “o DL já referia especificamente o «extermínio judeu»”, calculando que cerca de 300000 pessoas de origem judaica teriam sido exterminadas em campos de extermínio.
Bibliografia do artigo:
MILGRAM, Avraham, Portugal, Salazar e os judeus, Lisboa, Gradiva, 2010
NUNES, João Paulo Avelãs, “A memória histórica enquanto instrumento de controlo durante o Estado Novo. O exemplo do anti-semitismo”, Revista de História das Ideias, vol. 34, 2016
PIMENTEL, Irene Flunser, Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial, Lisboa, A Esfera dos Livros, 2008 PIMENTEL, Irene Flunser e NINHOS, Cláudia, Salazar, Portugal e o Holocausto, Lisboa, Temas e Debates, 2013, p.769
PIMENTEL, Irene Flunser e NINHOS, Cláudia, Salazar, Portugal e o Holocausto, Lisboa, Temas e Debates, 2013, p.769