A conversa entre Eduardo Lourenço e António Lobo Antunes sobre o país e o mundo português
No passado dia 30 de setembro, na Casa das Histórias Paula Rego em Cascais, foi o dia (ou noite porque o evento começou pelas 21h30) de os dois maiores vultos vivos da Língua Portuguesa se terem unido para um serão de conversa(s). Este evento foi organizado pela editora LeYa e pela Câmara Municipal de Cascais, sendo parte integrante de um certame que decorreu durante todo o mês de setembro – o Festival Internacional de Cultura.
As duas maiores figuras da Língua Portuguesa claro está, são Eduardo Lourenço e António Lobo Antunes, quer pelo seu prestígio nacional, bem como o granjeado além-portas. Não havendo nenhuma métrica que possa aferir o estatuto dos mesmos, as suas obras falam por eles e como António Lobo Antunes (ALB) diz sobre o amigo, de quem foi primeiro leitor e admirador, “há pessoas que conseguem fazer levantar uma cidade, um país ou o Mundo com uma linha, umas páginas de palavras, e o Eduardo é uma dessas pessoas”.
Eduardo Lourenço foi professor e é filósofo. É o autor das ricas análises nacionais “Heterodoxia I e II, Labirinto da Saudade – Psicanálise Mítica do Destino Português”, ou ainda “Canto e Signo – Existência e Literatura”. Já António Lobo Antunes foi médico e, neste momento, apenas se dedica à escrita, sendo célebre pelos seus livros sobre a Guerra Colonial Portuguesa (por ter servido como médico de guerra em Angola), entre os quais “Os Cus de Judas” ou “Cartas de Guerra – D’este viver aqui neste papel descripto”.
Mas a sua troca de ideias (sempre tão prazerosa) começou então por esse português que por ter estado tanto tempo fora conseguiu desenvolver a capacidade de olhar para nós através de outros olhos e com “tanto amor”, tendo sido ele quem nos definiu melhor, segundo ALB. Explicando o porquê de ter escolhido o tema para esta conversa – Requiem de um Império que nunca existiu – foi sempre falando com uma alternância entre o Império Real e o Império da memória, o que hoje em dia nos resta.
Tomando uma vertente menos macro e mais literária, o mote para ALB foi a conversa que tiveram no carro antes de chegar até ao local do diálogo informal que tiveram, e que foi invariavelmente tocar em Antero (de Quental), um nome inconfundível do mundo das letras (mas não só) do nosso país e de quem gostam tanto, eles os dois. Foi sobre ele que aos 18 anos primeiro escreveu tendo-o começado a ler aos 13/14 por sugestão do pai.
Tendo a bola passado novamente para Eduardo Lourenço, uma vez mais o seu enfoque se baseou no Portugal de antigamente, no posicionamento que outrora tivemos só porque “Afonso de Albuquerque conseguiu conquistar Goa”, mas também referiu o ponto importante que infere na (i)moralidade dos colonizadores e na falta de legitimidade que nós tivemos ao nos termos apoderado de tais territórios noutros continentes – que não eram nossos, embora pudéssemos pensar que sim.
Lobo Antunes foi o último a falar, ou melhor, a contar histórias, que sempre alegraram o público, e, já na etapa final, tentou “puxar” pelo amigo de longa data por ele ser uma presença sempre tão alegre e com um humor tão sagaz, mas que infelizmente naquele dia, como é relativamente verificável, se encontrava um pouco “mortiço”.
“A melhor forma de conhecermos um autor é lendo-o” e foi o que fez para fechar o parlatório, Eduardo Lourenço. Leu um excerto de um livro de Lobo Antunes para que o público se apercebesse de que ele “é um autor difícil, não-complacente, exigente” para com os seus leitores, pistas que já tinha deixado antes.
Mas o melhor é mesmo ver e absorver. Porque nem todos nasceram no tempo deles e por isso não os podem ouvir. São eles a prova de que nem todos os intelectuais são chatos. Porque devia ser um motivo de orgulho nacional para qualquer habitante da Língua Portuguesa, uma das mais bonitas e dúcteis do Mundo, ser contemporâneo destes dois Senhores com S grande.