Aleatórias memórias de acesso imediato
2005, terceiro ciclo. Anos de folia interminável e de detestáveis aulas de Educação Visual, igualmente intermináveis. Trabalhar ainda estava distante, mas se estivesse ali naquela altura, a minha ocupação seria “orelhudo” a full time. Ouvidos nos earphones e olhos no quadrado do binómio. “Da Funk” dos Daft Punk a bombar alto e a bom som, um dos destaques dessa estreia avassaladora que é Homework. “Around the World” era a pérola que se seguia, perdia-me na sua repetição metálica e sonhava em ver o mundo com um MP3 e todas as pilhas AAA do mundo.
2008, gloriosos anos de secundário. Ouvidos nos headphones e olhos nas tangentes e gráficos cartesianos sem Pi(o). Discovery dos Daft Punk a bombar alto e a bom som, para desagrado dos colegas nas secretárias mais próximas. Começo a apaixonar-me por álbuns e a descobrir artistas como deve ser. Quem são estes homens vestidos de robôs que fazem música tão intoxicante? Como é que um álbum que já saiu há sete anos consegue soar tão fresco e melhor do que muita coisa que vou ouvir na sexta-feira no Garage, no Loft ou no ABS, onde quer que seja que me arranjem guest?
2013, nostálgicas temporadas de faculdade. Ouvidos nas colunas de mais uma mítica festa da FCT, olhos naquela que viria a descobrir mais tarde que era uma cerveja a mais. Aulas práticas com pipetas e micro-organismos, cérebro demasiado empancado para inocular culturas celulares em condições. “Get Lucky” era simultaneamente a melhor e a mais irritante música à face da Terra, estava em todo o lado. Fácil de perdoar, tendo em conta o calibre fenomenal do álbum em que está incluída. Random Access Memories é o álbum dos Daft Punk da minha geração. Tinha nove anos quando saiu o Discovery, quando dizia que a música a sério era música clássica. Por muito que o estime, não é a mesma coisa.
2021, nine to five life. Ouvidos nos headphones que me custaram os olhos da cara, olhos repletos de lágrimas. Os Daft Punk acabaram e o mundo perdeu um dos maiores duos de música electrónica de todos os tempos. Penduraram as luvas mas, felizmente, há gravações dos seus combates. A sua curta discografia é das melhores que alguma vez existiu e a sua influência no panorama musical é imensurável. Acompanharam-me a vida toda. E certamente continuarão a fazê-lo, à distância de uma memória ou de um botão de play.