Entrevista. Corinne Bailey Rae: “O trabalho do artista é demonstrar liberdade e é isso que realmente quero fazer”
Sete anos depois do seu último trabalho, Corinne Bailey Rae está de volta com Black Rainbows. Este quarto álbum é uma surpresa que inclui electrónica e punk, para além dos géneros pelos quais é mais reconhecida, como R&B, jazz e soul. Esta colecção de canções, para além de sublime e surpreendentemente coesa, está imbuída de mensagens políticas e causas sociais inspiradas pela exposição sobre História negra que a cantora visitou no Stony Island Arts Bank, em Chicago. Esse momento formativo para ela acabou por moldar a sua maneira de compor e permeia todas as canções do disco. Foi sobre o processo criativo e o som de Black Rainbows, sobre a sua carreira e vários outros tópicos que falámos com a autora de “Put Your Records On”, que respondeu às nossas questões com um permanente sorriso no rosto e enorme simpatia.
Nos próximos dias 4 e 5 de Novembro, Corinne actuará em Lisboa e no Porto, respectivamente, no âmbito do Misty Fest. Em Lisboa, tomará o palco do Capitólio, enquanto que no Porto o concerto será na Casa da Música.
Pelo que percebi, o Black Rainbows demorou bastante tempo para ficar completo. Como foi o processo de criar estas canções?
O processo de criação das canções foi bastante rápido. De certa forma, foi o mais rápido que já tive em termos de reacção a algum objecto ou ao estudo de pedaços de História e acontecimentos. Quando a música aparecia à minha frente, o resto simplesmente surgia. Eu estava a trabalhar com as KING em Los Angeles e o Steve [Brown, marido da cantora e co-produtor de Black Rainbows] criou uma batida no DFAM — um sintetizador de percussão — que soava como cascos de cavalos a trotar sobre uma ampla planície. E eu comecei a pensar numa fotografia que tinha visto, de uma rapariga pioneira negra, numa história romântica e na “Red Horse” [canção de Black Rainbows].
A escrita das canções em si não demorou muito tempo, de todo. Era uma resposta instantânea ao objecto, como com “New York Transit Queen”, em que eu vi uma fotografia de uma rainha de beleza na parte de trás de um camião de bombeiros e instantaneamente quis transformá-la numa canção riot grrrl. Essa foto lembrou-me de posters de bandas dos anos 90. Depois houve outras canções que demoraram mais tempo. “Put It Down” surge de uma improvisação electrónica que o Steve e o Mikey [Wilson, baterista da cantora] estavam a fazer. Foi na altura em que eu estava grávida e prestes a dar à luz. Eles estavam a trabalhar no nosso estúdio, que na verdade é o andar de cima da nossa casa. O Steve estava muito entusiasmado com esta música e disse “Tens de vir cá a cima ouvir esta música”, mas eu disse-lhe “Estou muito cansada, não quero trabalhar agora. Faz isso e eu vou tomar um banho e ler uma revista”. Quando estava no banho, ouvia estes sons que vinham do tecto. Então, quando eles iam dormir, eu ia silenciosamente até ao piso de cima e ouvia o que eles andavam a fazer. Alguns dos improvisos eram realmente loucos e outros um pouco mais calmos.
Entretanto encontrei uma peça, “Put It Down”, que durava 10 minutos. O nosso estúdio tinha acabado de ser renovado, por isso ainda não sabia como ligar nenhuma das coisas, mas o microfone estava lá e simplesmente comecei a cantar sobre largar algo, soltar um peso de cima. Imediatamente pensei na experiência que tinha tido no Arts Bank, de uma festa em que as pessoas tinham de escrever as suas amarguras, as coisas que as estavam a incomodar. Depois dançámos durante quatro horas e, no final, alguém pegou fogo a todas as amarguras e elas ardiam.
Porque é que achas que demorou tanto tempo?
O mais difícil foi a produção, como sempre, porque eu e o Steve gostamos de a fazer juntos. Ainda não encontrei um produtor a quem possa dizer “Toma, aqui está a música. Vou fazer compras. Quando regressar, pode estar tudo a soar incrível?”. Nunca encontrei ninguém assim. E também, honestamente, eu gosto de produzir música. Eu gosto de estar no estúdio. Gosto de pensar: “que textura isto deveria ter?”.
Na “Erasure”, andámos num vai e vem porque tinha uma mensagem muito forte; é sobre uns objectos difíceis do Arts Bank. Tentei muitas baterias diferentes na faixa. Dizia “têm de soar como baterias loucas, devem ter símbolos”. Cada vez que adicionávamos as baterias, eu ficava distraída pela sensação da canção, era algo ao som do qual poderias fazer moches. Mas aí não estarias a ouvir a letra nem a história. Tornava-a demasiado festiva e alegre, quando eu queria que soasse ominosa. Mas depois o nosso baterista, eventualmente, insistiu que não a fizéssemos de forma convencional e simplesmente usou os timbalões. Eu queria uma sirene de bombeiros, e acabámos por usar a sirene à porta de nossa casa. Depois o Steve trabalhou o som, até que se tornou numa coisa sub-harmónica grave que se ouve no fundo, de forma a perturbar.
Por isso acho que, em muitos casos, a canção pode estar terminada, mas a música não está a comunicar exactamente aquilo que eu quero comunicar. Isso demora muito tempo. Como é que eu faço as duas metades de “He Will Follow With His Eyes” soar realmente diferentes uma da outra? Uma é dos anos 50, sonhadora e sob o feitiço da Valmor [empresa de cosméticos dos anos 20, direcionada para pessoas negras]. Depois é a pessoa a criar a sua própria apreciação da negritude, e isso tem de soar diferente. Queria que referenciasse música de fusão abstracta, que era a música negra em voga nos anos 70.
Acho que eu estou a tentar contar uma história com a canção, mas quando a canção está terminada, eu quero sublinhar a história com a música. Isso demora muito tempo para mim. Para além disso, tenho dois filhos pequenos [risos].
“A utopia falhará sempre, mas é o objectivo: usá-la como estrela Polar. Temos de ser esperançosos e positivos, não podemos ser cínicos com o nosso mundo, temos de acreditar.”
Apesar dos temas pesados de algumas canções, como no caso da “Erasure”, a mensagem geral do album ainda parece ser esperançosa e perseverante. Era isso que pretendias conjurar?
Sim, acho que isso é provavelmente por minha causa. Simplesmente sou uma pessoa esperançosa. Tendo estado debaixo do peso de toda esta história, o principal sentimento que sinto é esperança. Claro que há toda uma história de reacções violentas contra pessoas de origem africana, mas eu penso em tudo aquilo que estas pessoas criaram, toda esta cultura incrível e como a mesma influenciou o mundo, a arte, a dança, a música, a poesia, a política, a maneira de organizar a democracia, a Igreja negra, a sua natureza de chamamento e resposta e como, por sua vez, isso influenciou tanta produção de arte no mundo.
Eu sinto que é um triunfo destas pessoas que sobreviveram e prosperaram, quase se tornaram super-heróis, de alguma forma. Como o Duke Ellington, o [John] Coltrane ou a Nina Simone, são imparáveis de certa forma. Ou mesmo a revista Ebony, de um casal que se tornou multimilionário em Chicago e que a distribuiu por todo o mundo. Eles tinham o seu próprio edifício onde tinham muita arte africana. As fotos do edifício Johnson parecem algo tirado do “2001: Odisseia no Espaço”, com as carpetes espiraladas e o estilo dos anos 60. É realmente fascinante aquilo que alcançaram contra todas as expectativas.
A canção “Earthlings” fala realmente sobre isso, de algo que eu sinto para todos nós, que é a possibilidade massiva de não apenas mudança pessoal, mas de mudar o mundo, mudar as estruturas em que nos encontramos. Tudo é regido por pessoas, mas às vezes sinto que nos esquecemos disso e pensamos que é tudo maquinaria, mas são realmente pessoas. Se conseguires chegar ao coração das pessoas, convencer CEOs, donos de riqueza ou políticos… os seus corações poderão amolecer e aperceber-nos-emos de que todos partilhamos este planeta e que a única forma de sobreviver é trabalhando em conjunto. Podem haver mudanças massivas no mundo. Analisar toda esta História fez-me sentir positiva sobre aquilo que humanos podem criar.
Sim. Na verdade respondeste a uma das questões que tinha sobre a “Earthlings”, sobre o que uma utopia seria para ti e como poderíamos chegar lá.
Eu vi no Arts Bank, principalmente nos livros, diferentes tentativas negras de alcançar uma utopia e duas vozes diferentes, também. Poderias vê-lo como uma divisão clássica entre Martin Luther King e a fase inicial do Malcolm X. Malcolm X disse: “Nós não somos bem-vindos aqui. Fomos trazidos para a América, a Inglaterra, as Caraíbas e o Brasil sem a nossa permissão. A única maneira de sobreviver é criar um espaço negro separado. Devemos virar-nos para dentro para nossa própria protecção.” E depois Martin Luther King disse: “Por várias razões diferentes, estamos aqui, mas devemos abraçar os nossos vizinhos, encontrar aliados, espalhar amor e imergir-nos em todo o lado, não nos julgarmos pela cor da nossa pele…”
Há estas diferentes utopias que surgiram. Será virar-se para dentro ou para fora? Será a de Marcus Garvey, em que todos têm de voltar para África? Será algo como uma comuna, em que te separas das pessoas, vives numa quinta e tens regras próprias? Mas na realidade, a única forma de atingir a utopia é com toda a gente. Tudo está interligado, como fazemos trocas, como movemos comida de um lado para o outro, o ambiente… A utopia falhará sempre, mas é o objectivo: usá-la como estrela Polar. Temos de ser esperançosos e positivos, não podemos ser cínicos com o nosso mundo, temos de acreditar. Há comida suficiente para todos, há educação para todos, há segurança para todos, sabes? Temos de ir nessa direcção.
“O trabalho do artista é demonstrar liberdade e é isso que realmente quero fazer. Prefiro ter mais discos do que conter-me para ter o derradeiro mega-êxito, perfeitamente comercializável.”
O que é que a negritude significa para ti?
Acho que a negritude é um arco-íris, um espectro. Acho que isso foi uma coisa muito importante de aprender à medida que ficava mais velha. Um dos meus pais é branco: a minha mãe é inglesa, de Yorkshire, e o meu pai é das Caraíbas, de São Cristóvão. Por isso sempre convivi com estas duas identidades diferentes e acho que no Reino Unido há muita gente que tem um progenitor branco e outro negro, é uma combinação familiar.
Acho que a negritude é importante para mim porque sinto que construí amor-próprio fora da pressão [social] de não sentir amor e de rejeitar a cor da minha pele, a forma da minha cara ou a textura do meu cabelo. Quando estava a crescer, não havia muita imagética de negritude no Reino Unido, pelo menos não positiva; ainda havia restos de imagética de há muito tempo. Costumávamos ter um frasco de geleia que tinha um golliwog [desenho de um boneco de trapos com pele negra e traços característicos da prática conhecida como blackface] no rótulo. Nos livros de História, não havia muitas pessoas negras, mas talvez tivesse imagens de vítimas de linchamento. Na escola, talvez visse dois corpos mutilados e uma foto do Martin Luther King, e era isso. Certamente não veria mulheres negras, nem pessoas negras com dignidade, músicos de jazz, negros de classe média… tive de esperar até ser mais velha para ver essas imagens.
E foi por isso que o Arts Bank foi tão especial, mesmo na minha idade. Eu já tinha 30 e muitos anos quando comecei a ir lá. Ver essas imagens de glamour, do quotidiano negro e da massiva classe média negra na América, que eu desconhecia, fez-me pensar que sermos afastados dessas imagens pode mudar a forma como nos vemos a nós próprios. Por isso penso que, às vezes, associava as coisas que eu desfrutava à branquitude em vez de pensar: “Estas coisas são para toda a gente”, sabes? Como música clássica, roupas elegantes, bibliotecas, ler… Tenho interesse nessas coisas e foi a primeira vez que fui a uma biblioteca que era grandiosa, com grandes prateleiras, um edifício lindo que também tinha livros sobre cultura negra. Geralmente é uma coisa ou outra. A maneira como o Arts Bank cria espaço para a elegância negra foi algo novo para mim.
Passando para o som do álbum. Antes da tua carreira a solo, estavas numa banda de rock chamada Helen. Sempre quiseste trazer esse som para a tua música?
Sim! Foi assim que comecei. A primeira vez que escrevi música fui muito influenciada pelo Kurt Cobain. A outra guitarrista da banda, a Jen, tinha gravado uma cassete do MTV Unplugged e víamo-lo a toda a hora. Fiquei muito impressionada por esta pessoa que tinha uma certa dor dentro de si que conseguia ser bonita, também. Conhecia a música dos Nirvana, mas ter a oportunidade de a ouvir neste contexto acústico e também de a ver [no vídeo] foi uma maneira de explicar o que se passava na música.
Sempre tive interesse em música: toquei violino, estive em orquestras, em coros… mas a música que podíamos tocar soava muito simples comparada com a música pop dessa altura: Michael Jackson, produção do Quincy Jones, cordas maximalistas, sintetizadores, um coro de fundo massivo!
Entretanto a música pop mudou de repente nos anos 90 para se tornar em voz, guitarra, baixo e bateria. Qualquer pessoa com um ouvido musical podia ouvir o que o baixo estava a fazer, o que a guitarra estava a fazer e pensava: “Eu posso fazer isso, nós as 4 nesta sala podemos fazer isso acontecer”. Essa foi a minha porta de entrada na música. Tinha essa banda e os Nirvana eram os nossos deuses, mas também gostávamos de Veruca Salt, Hole, Radiohead, Belly, algumas bandas indie dessa época… Por isso, quando comecei a fazer o Black Rainbows, como estava a pensar nele como um projecto secundário, queria simplesmente poder tocar o que quer que surgisse. A “Erasure” tem aquela agressividade, a “New York Transit Queen”… imediatamente saltaram à vista como sendo canções de guitarra e foi fácil de escrever porque foi aí que comecei na música.
Para além do rock e do punk, tens outros estilos no álbum: electrónica, R&B… Alguma vez te preocupou que os diferentes estilos não combinassem?
Não pensei nos estilos, porque sabia que a ideia do álbum era muito específica e limitada. Cada canção é inspirada pela arte, pelos objectos e pelos eventos do Stony Island Arts Bank. Por isso esse foi o meu fio condutor. Senti que, desde que saísse do Bank, poderia ser qualquer coisa, porque tudo voltaria ao Bank. E novamente, por pensar que seria um projecto secundário, não estava a pensar em como seria recebido. Pensei: “Bom, não vai ter o meu nome nele, por isso não vão haver nenhumas assunções de como deve soar”.
“Adoro música e há demasiada boa música para mim para fazer apenas um tipo de coisa. Para além disso, não quero encurralar-me nesta fase. Quero continuar a crescer.”
Olhando para o teu primeiro álbum, ainda te identificas com a Corinne de então?
Sim, identifico! Sinto que estou mais velha, noutras fases de mim mesma. No final destes espectáculos, temos tocado a “Like a Star” às vezes; se as pessoas trazem crianças, tipo uma rapariga de 9 anos sentada na fila da frente, eu toco a “Put Your Records On”, porque é a única canção que ela reconhecerá. Mas sim, ainda me identifico realmente com ele. O Black Rainbows, de alguma forma, foi uma maneira de me expandir em vez de afastar coisas. Ainda sinto a “Green Aphrodisiac”, a “Breahtless”, a “Closer” ou qualquer uma dessas canções. Ainda adoro jazz e soul. Isto não é uma rejeição do que eu fiz, é mais criar mais espaço para que da próxima vez também possa fazer algo diferente. Adoro música e há demasiada boa música para mim para fazer apenas um tipo de coisa. Para além disso, não quero encurralar-me nesta fase. Quero continuar a crescer.
Quais são algumas das maiores mudanças que sentiste em ti desde o início da tua carreira até agora?
Neste álbum, sinto que me dei mais permissão de brincar com diferentes estilos, de experimentar coisas, de experimentar com estruturas de canções. Com o meu terceiro álbum, estava tão habituada a mandar coisas para a minha equipa, a editora ou a A&R e que eles dissessem: “É muito bonito, mas não é uma canção de rádio… não é o primeiro single“. Senti que, com o The Heart Speaks in Whispers, era sempre: “Qual é o primeiro single? Qual é o primeiro single?”. Era tudo à volta de ter uma canção que derrubasse a porta e, depois de a atravessar, poderia fazer tudo o que quisesse. Senti só que, mais para o fim, nem precisava de enviar nada para eles para saber que estava errado. Estava a tocar e pensava: “Isto não está certo, não é bom o suficiente, é demasiado longo, demasiado lento, não é sobre um tema que as pessoas conheçam ou compreendam…”. Sentia-me a limitar-me tanto que se tornou doloroso escrever música. Escrevi tantas canções para esse álbum que nem terminei. Fiz uma promessa a mim mesma de nunca mais fazer isto de novo. O trabalho do artista é demonstrar liberdade e é isso que realmente quero fazer. Prefiro ter mais discos do que conter-me para ter o derradeiro mega-êxito, perfeitamente comercializável. Sinto que essa não é a forma que eu quero trabalhar. Por isso eu sinto que a maior diferença em mim é: mais liberdade, mais criatividade, arriscar mais, preocupar-me mais, ouvir mais a minha própria intuição, todas essas coisas.
Ainda sobre esse período, como te sentes especificamente sobre a canção “Put Your Records On”, sendo que é a canção pela qual és mais reconhecida?
Adoro essa canção. Para mim, há uma ligação entre essa canção e o final da “He Will Follow You With Eyes”, que diz “I’ll be smouldering in my plum red lipstick / My black hair kinking / My black skin gleaming”. Parte da “Put Your Records On” tem essa mensagem forte de sentir que as pessoas estão a gozar contigo por seres tu próprio, e o quão importante é ocupar-te e ter esse amor-próprio que não vem de mais ninguém. Mesmo quando diz “Got to love that afro hairdo” ou “Go ahead, let your hair down”, essas coisas eram específicas para mim. Costumava ter o meu cabelo apanhado, muito apertado. Ou o meu cabelo era tratado quimicamente para ter caracóis ou ser liso.
Eu lembro-me que a Naomi Campbell era a deusa dos nossos tempos, mas era como se a sua apreciação parasse aqui [aponta para o cimo da testa e mantém o dedo]. Amavam-na da ponta dos pés até aqui [junta o dedo da outra mão no mesmo sítio] e depois daí ela tinha de ter o cabelo lisíssimo [com as duas mãos, aperta o volumoso cabelo para baixo, simulando um penteado liso]. Eu costumava olhar para ela e pensava: “Ela é negra e chinesa? É negra e japonesa? Como é que ela tem aquele cabelo liso perfeito?”. Assim que cresci, percebi que aquele não era o seu cabelo, mas que para ela ser considerada bonita, era assim que o seu cabelo tinha de ser. Essa foi uma mensagem muito forte para raparigas negras nos anos 90. É tipo: “Esta parte é linda. Os lábios cheios, eles adoram isso. A pele castanha, adoram isso. Mas o cabelo afro…”. Para mim, há uma grande parte dessa canção que ainda é uma mensagem importante para partilhar com a audiência. Também gosto do seu espírito brincalhão e da sua girlishness. Na verdade, é uma canção difícil de cantar, tecnicamente. Por isso sinto que, quando a canto ao vivo, estou só a tentar acertar, porque tem poucos momentos para respirar. Fico muito contente por ser reconhecida por essa canção, ainda a adoro.
Vais actuar em Portugal daqui a uma semana e meia. O que é que o público pode esperar do espectáculo?
Bom, vai ser um concerto do Black Rainbows. Por isso sinto que tenho de acompanhar as pessoas, digo “esta é tal canção, é daqui que ela vem” e depois simplesmente atiramo-nos a ela. Queremos fazer uma festa mais para o final do concerto. Temos um saxofonista excelente, às vezes eu estou a dançar no meio das pessoas… Nos Estados Unidos, chamámos algumas pessoas para a frente e fizeram de coro. Sinto que eu própria não sei o que esperar, porque é o espectáculo é tão novo. Depende muito do público e do que ele quer e precisa. Provavelmente tocarei uma ou duas canções mais antigas no final, mas quero focar-me neste disco. É a única vez que tocarei este álbum todo. Eu digo isso a mim mesma, porque quero deixar toda a gente feliz, mas estou consciente de que não estou a tocar a “Butterfly”, a “Breathless” ou o que quer que as pessoas queiram. Da próxima vez que voltar, tocarei essas canções. Mas pronto, espero que as pessoas estejam dispostas a embarcar nesta viagem e desfrutar.
Este álbum é um pouco como um botão de refresh. O que é que o futuro te reserva, musicalmente?
Eu sinto que está tudo em aberto, agora, sinto-me entusiasmada! Um dia eu quero fazer um álbum de jazz, talvez um dia faça um disco com uma orquestra, gostaria de fazer um álbum de folk acústico, gostaria de fazer mais coisas com electrónica louca, mais coisas com guitarra… Sinto que há tanta música boa que quero só arriscar mais e divertir-me mais. Desde que estejas inspirado, desde que a composição simplesmente surja de ti, sinto que não há limites.