Entrevista. Ross Baker: o segredo do colorista “é nunca parar de explorar”
Quem é o colorista? O que faz o colorista? No cinema, os coloristas são alguns dos profissionais cujo ofício está destinado a aparecer nas últimas linhas dos créditos, aquelas às quais já quase ninguém presta atenção. No entanto, são os coloristas que trabalham a cor e a luz e dão aos filmes, séries e documentários o aspeto que conhecemos. Sem eles, tudo seria menos interessante e apelativo. Ross Baker é reconhecido como uma das figuras mais importantes da pós-produção londrina. Começou em 1996, como assistente de telecine na Metrocolor Film Labs; quatro anos depois, passou para a Pepper Post e subiu de posição para colorista júnior. Mais quatro anos passaram e Baker subiu mais um degrau na carreira, enquanto colorista sénior na St. Anne’s Post. Por fim, assentou em 2008 na Halo Post Production, onde é o colorista sénior principal. Ao longo dos anos, tem trabalhado nos mais diversificados tipos de projetos (dramas, comédias, documentários, longas-metragens, anúncios publicitários, vídeos musicais e vídeos corporativos), alcançando o prestígio de nomeações e prémios. The Missing, The Space Shuttle’s Last Flight, John & Yoko: Above Us Only Sky, My Generation, The Planets with Professor Brian Cox, Jamie’s Money Saving Meals e Great Barrier Reef with David Attenborough são algumas das produções em que trabalhou.
Começando pelo princípio: o que faz um colorista? Como funciona o teu trabalho no dia-a-dia?
Como coloristas, no dia-a-dia, pegamos num programa na sua forma RAW, ainda sem qualquer trabalho de cor, e manipulamos as cores. Mexemos no contraste, saturação e tons, de forma a que o programa tenha um aspeto consistente logo desde o início. Se for um documentário, por exemplo, queremos equilíbrio e balançamos as sequências. Se for um drama, podemos ter de criar uma certa aparência ou um certo estilo. Normalmente, trabalhamos o programa de forma cronológica, do início até ao fim, ajustamos as cores entre sequências de forma a que tudo fique consistente. Estilizamos, criamos um estilo ou um sentimento e, depois, trabalhamos as sequências para que o programa todo tenha o mesmo ambiente. Depois, uma parte do nosso trabalho é detetar problemas. Pode ser no próprio material, mas qualquer parte do processo pode ter algum problema, então temos de o detetar e avisar, de forma a que seja resolvido antes de o programa passar à fase seguinte.
O que te faz tão apaixonado pela cor?
A cor é fantástica [risos]. É difícil explicar em palavras o que te torna tão apaixonado por algo. É fazer isto durante anos sem nunca perder o interesse, acho que isso é parte de onde vem a paixão. Eu gosto mesmo de manipular imagens, limá-las até chegarem a uma certa forma. É como pintar, mas sem usar um pincel; é pintura digital, basicamente. O que me faz ser verdadeiramente apaixonado por colorir de forma profissional é a resposta dos clientes, quando consigo atingir exatamente o que desejavam para o seu filme. É um processo muito gratificante, para mim e para eles, por poderem finalmente ver num ecrã aquilo com que tinham sonhado.
Como começaste? Quando decidiste que querias fazer isto?
Eu comecei a trabalhar num laboratório de película, com película revelada, e descobri o departamento de telecine, que é onde se pega nas películas de 16 e 35 milímetros e se converte em sinal digital, faz-se a coloração e prepara-se para ser transmitida na televisão. Na altura em que comecei, o pessoal da indústria ia filmar o dia todo e depois enviava a película para o laboratório para ser revelada e processada. Depois, nós púnhamos uma correção de cor muito simples na bobina de filme inteira, para que eles pudessem ver o que tinham. E foi isso que me levou à coloração – e, a partir daí, eu queria ser a pessoa que punha a cor final e o estilo final do filme. Então, desenvolvi as minhas competências, mudei de trabalho – passei para outra empresa – e treinei-me para colorir.
Como escolhes os teus projetos?
Não escolho sempre. Gostava de dizer que posso escolher cada projeto em que trabalho, mas muitos projetos são-nos atribuídos e muitos até vêm de clientes habituais. Podemos trabalhar com um cliente pela primeira vez e parte desse processo é desenvolver uma relação com o cliente, compreender a sua visão e fazê-lo descobrir o que realmente quer do filme. E, à medida que essa relação evolui, acaba por haver alguma confiança e um certo vínculo, e os clientes muitas vezes voltam. Então, às vezes, nem é uma questão de escolha, é apenas um interesse mútuo. Trabalhas com um cliente, percebes a sua visão e ele confia em ti, e o trabalho acaba por continuar a chegar. Em alguns trabalhos, tu até os vês a chegar e nem te são atribuídos, mas pressionas para ficar com ele, se fores apaixonado pelo assunto em particular. Há uns tempos, fizemos um programa sobre um condutor de corridas que perdeu as pernas num acidente, e eu disse mesmo ao cliente que não queria saber se ele não tinha orçamento suficiente, eu ia colori-lo na mesma. Porque queria fazer parte daquele processo, queria ser uma parte daquele projeto. Não podes sempre escolher no que trabalhas, mas fazes sempre o teu melhor.
Vamos falar de cores.
Claro [risos]!
Quando recebes sequências para editar, os realizadores e diretores de fotografia já te dizem que palete de cores querem? Ou tens mais liberdade criativa?
Depende de que tipo de projeto é. Escolher o estilo para o programa pode ser… se for um drama, então já haveria um processo muito bem pensado de antemão sobre o vestuário, design de cenários, escolhas de localizações, e a aparência vai começar a ser delineada bem cedo com testes de câmara. Outros projetos como documentários, normalmente não têm grande orçamento e, consequentemente, não têm a liberdade para fazer esse tipo de coisas. Então, nesses casos, eles vêm e, quando muito ,mostram-te algumas stills que têm numa moodboard e dizem-te, “eu gostava mesmo que o meu programa tivesse este aspeto, o que podes fazer?”. E, a partir desse ponto, as imagens vão ser trabalhadas para tentar chegar a esse aspeto que eles querem, e isso pode ser muito difícil, porque as filmagens em si podem não contribuir por si só para a visão que o cliente tem para o filme final. Mas nós fazemos o melhor que conseguimos e temos de saber gerir as expetativas. O facto de entrarmos num projeto logo no início faz imensa diferença, porque podemos ter logo uma influência considerável no aspeto do programa. Numa longa-metragem, farias parte do processo muito cedo, por exemplo. Com projetos de orçamento baixo, simplesmente não têm o tempo e os meios para o fazer. Fazemos testes na mesma, se pudermos; oferecemos sempre testes grátis para as pessoas virem testar coloração ou mesmo conselhos para decidir a aparência antes de se começar a filmar, porque beneficia o projeto todo a longo prazo.
Trabalhas com ficção, documentário, séries, anúncios publicitários. Quais são as principais diferenças?
Se estiveres a trabalhar num anúncio publicitário, vais passar muito mais tempo com o produto – o que quer que seja, roupas, packs, uma lata de Coca-Cola. Eu costumava fazer os anúncios para os medicamentos da azia, então ficávamos imenso tempo a tentar com que o pacote ficasse exatamente igual ao que fica nas prateleiras. Isso é o mundo dos anúncios; passas imenso tempo a trabalhar em aspetos individuais do filme, mesmo que só tenha uns 30 segundos de duração. Se estiveres a trabalhar num drama, crias um estilo e um aspeto específico. Os tons de pele vão ser aspetos muito importantes, tens de garantir que os atores e as atrizes ficam com boa figura, tens de te certificar que a narrativa da história está representada nas cores. Se estiveres a trabalhar em documentários, a tarefa vai ser tentar que os elementos visuais tenham o melhor aspeto possível, porque queres que as pessoas… Sabes, nem toda a gente vai ter a hipótese de ir às Ilhas Galápagos, então queres que as pessoas possam ver os sítios na televisão, sentir que lá estiveram e que viveram elas próprias aquela experiência. Então, temos de realçar as riquezas, as texturas, a envolvência em toda a sua plenitude. Ambiente quente ou ambiente frio, vais querer conseguir passar essa sensação para a audiência. Grande parte disso é ires adaptando. Depois, se estiveres a trabalhar em longas-metragens, os cenários, o guarda-roupa, os conceitos e as ideias são pensados ao pormenor com bastante antecedência, então é um processo completamente diferente.
Qual preferes?
É difícil [risos]. Eu tenho muita sorte de trabalhar onde trabalho, porque recebo uma ampla variedade de coisas. Obviamente, adoro documentários, por causa do que podes fazer com as imagens para as fazer sobressair e brilhar. Adoro dramas e comédias, porque são mais elaborados, tens a oportunidade de atribuir delicadeza e perfeição às sequências. E também tens bastante mais tempo para poderes ser exato, porque têm um orçamento maior e entendem melhor o que precisa de ser atingido. É difícil para mim escolher um, porque acabo por gostar de todos os tipos de trabalhos. Colorir é divertido [risos]. Não importa o que estejas a colorir, é sempre divertido e interessante.
E os documentários grandes? O orçamento é maior.
Adoro-os. Sim, o orçamento é maior, mas, mesmo assim, não é tão grande como os dos dramas. Uma das séries documentais que fiz foi para o Brian Cox, na BBC Two, chamada The Planets, e tivemos dois dias para colorir cada episódio, 16 horas, o que é fantástico. Normalmente, tens 8 horas para um documentário de 60 minutos. Era uma mistura de efeitos visuais e filmagens de localização, então tive a oportunidade de aperfeiçoar detalhes. É isso que eu gosto mais, quando posso construir algo em que se calhar os realizadores nem sequer tinham pensado, ou quando pedem a minha opinião e me dizem, “como conseguimos fazer nesta filmagem da Terra parecer Marte, há 32 milhões de anos atrás?”. “Não faço ideia, mas vamos brincar com alguns brinquedos e ver o que conseguimos arranjar.” E a ideia de poder oferecer três ou quatro aspetos diferentes, explorá-los e desenvolver um aspeto final… adoro isso, é a parte mais divertida.
E os documentários do David Attenborough?
Oh, isso foi absolutamente incrível. O homem é um ícone nacional e é um prazer imenso poder trabalhar nos programas dele. Eles investem bastante nos programas e têm uma distribuição mundial tão grande, vai haver gente à volta do mundo todo a vê-los. Eu não ponho mais esforço num documentário grande do que num documentário mais pequeno, ponho o máximo esforço que posso em tudo o que trabalho, porque, ao fim de contas, o meu nome aparece sempre nos créditos. Pessoalmente, não vou conseguir chegar ao fim e pensar “bom, isto foi fantástico” e esperar pelos créditos para ver o nome de quem coloriu; se começas a escolher a dedo os trabalhos em que te esforças, a pôr o teu tempo apenas nos trabalhos grandes, então vais começar a perder outros trabalhos que são igualmente importantes e também acabas por perder a paixão pela arte de colorir. Aliás, perder a paixão por qualquer trabalho, se apenas te concentras nos que vão ser grandes e populares. É bom manteres os pés no chão.
Já trabalhaste com ficção científica? Alguns têm paletes de cor muito wacky.
Sim, algumas vezes [risos]. São muito divertidos. Mesmo quando as pessoas querem cores wacky para ficção científica, voltam sempre com “será que as cores de pele têm bom aspeto?”. “Tornamos o plano todo verde vivo, claro que não vão parecer bem!” [risos]. É divertido, mesmo que difícil, e é bom explorar aparências mais wacky. Em muitas cenas futurísticas, os realizadores preferem pôr as cores de lado, manter a palete mais apagada e ter apenas uma cor particular bastante forte. Se pensares no Matrix, por exemplo, eles meio que se despejam de todas as cores, quando estás no Matrix, criam aquele verde e, quando se volta para o mundo real, era tudo muito azul. Tons de pele eram verdes e amarelos num e azuis frios noutro, mas isso não era algo que questionasses enquanto espetador. Simplesmente aceitavas, porque estava bem feito.
Qual foi o projeto, até agora, mais desafiante? O que simplesmente não conseguias acertar.
Acho que ainda não passei por nenhum projeto em que não tenha conseguido atingir o que o cliente queria, mas, às vezes, é um processo bastante complicado para lá chegar. Acho que, em termos de coloração, consegui sempre atingir o que o cliente quer; a nível de desafios técnicos, trabalhos em 3D têm sido os mais difíceis de colorir, porque estás confinado por limitações no quanto podes fazer, dependendo de quão bem as duas câmaras combinam e da tecnologia de exibição. Porque, tradicionalmente, a tecnologia de exibição de 3D não mostra as imagens muito claras, então é consideravelmente escuro e tens de fazer ajustes conscientes à imagem, pensando no que irias colorir em 2D, mas adaptar para 3D. Mas, no geral, todos os trabalhos que já fiz… podem ter levado o seu tempo, até porque depois começa a haver um investimento pessoal no projeto. Se só tiver 8 horas para colorir um programa e já estiver com 6 horas de trabalho sem conseguir atingir o aspeto que o cliente quer, tens de fazer aquela decisão, “invisto o meu próprio tempo nisto para conseguir acertar?” ou digo “desculpem, ficamos sem tempo”: não consigo fazer isso. O trabalho, muitas vezes, passa por cima da vida pessoal, mistura-se tudo e às vezes fica meio caótico, mas eu fico sempre até acertar.
https://www.youtube.com/watch?v=97WcGRWI6tY
Já aconteceu de algo não ficar como gostarias, devido a decisões de outros envolvidos no projeto?
Nem por isso. Às vezes não gostas do assunto do material, não desenvolves qualquer tipo de conexão com o tema, ou até nem o entendes. Até podes nem gostar do programa em si, mas, mais uma vez, tens de te separar do conteúdo em si, de certa forma, e tens de compreender a narrativa da história e o que é preciso atingir a nível de cor. A tua prioridade é essa, não apreciar do programa em si. E, muitas vezes, é preciso pedir ao cliente referências visuais, se sequências devem ser quentes ou frias ou noturnas. Muitas vezes, não vemos o programa na perspetiva de um espetador, porque nos concentramos tanto no visual.
Esta vai ser uma difícil: qual é o trabalho de que te orgulhas mais?
Eish [risos]! Estou velho, já fiz muito. Não sei. Fiquei muito orgulhoso de algumas comédias que fiz, porque pude criar aspetos muito doidos e estranhos e explorar ideias diferentes. Depois, é difícil não ficar orgulhoso de séries como The Missing, que tiveram números sólidos de audiências, foram vistas e adoradas por imensas pessoas. É difícil não dizer que estás orgulhoso por toda a gente ter visto, porque é muito bom ser reconhecido pelo que fazes. Mas é muito estranho, às vezes estás a trabalhar num projeto de baixo orçamento que conta com dinheiro quase nenhum, e esforças-te mesmo muito para conquistar algo e chegas ao final e pensas “isto foi incrível, ficou mesmo bem”. E depois recebes um programa de alto nível, no qual nem tens de fazer tanto, e toda a gente diz “ficou lindo”. E eu penso, “sabes, eu estou é mesmo orgulhoso daquele programa diurno que ninguém viu, porque trabalhei imenso para conseguir que tivesse o aspeto que tem hoje”. Nos dramas, não tenho de trabalhar tanto muitas das vezes, não tenho de mexer tanto porque a imagem inicial já é de grande qualidade e já vem de acordo com a visão dos realizadores. E, às vezes, noutro tipo de programas estás ali já a esticar os limites porque os orçamentos são baixos.
Uma pergunta mais abstrata: como escolhes entre a quantidade infinita de possibilidades de tons?
Ao fazer um programa, ter um aspeto específico, uma coisa que as pessoas perdem de vista… dizem, “quero uma coisa completamente diferente, quero pensar fora da caixa”, então começamos a trabalhar numa aparência fora da caixa e as pessoas ficam assustadas muito rápido, e depois pedem para se recuar um pouco. Começas a escolher um ambiente mais frio, com um ar duro, começas a tirar cores e saturação e a puxar o contraste e as pessoas ficam, “oh, assim fica frio e pouco convidativo”. Então começas a refazer. Um pouco mais natural, com um toquezinho especial disto ou daquilo, com sugestões do que eles queriam inicialmente, e percebes que o que as pessoas querem verdadeiramente é o que veem todos os dias, mas um pouco mais forte. É aí que está a diferença. Muitas pessoas dizem que querem algo “cinematográfico”, mas não entendem muito bem o que isso significa. Ou dizem que querem algo super estilizado, mas, na prática, não é isso que querem. No fundo, querem que tenha um bom aspeto, mas com um toque de calor, ou com uma textura diferente. É uma questão de balançar as coisas e lidar com os clientes e com as escolhas.
Há algum tipo de filme, realizador, projeto, com que gostarias de trabalhar no futuro?
Gostava de trabalhar em mais dramas e algumas longas-metragens maiores, por causa do desafio e do prestígio que trazem consigo. Das experiências que vives com esse tipo de trabalhos de topo, porque podes passar muito mais tempo a trabalhá-los, mais tempo a limar e nunca nada fica apressado – dedicam muito mais tempo à fase de colorir. Gostava de continuar o meu trabalho nos documentários grandes, é um género que viaja pelo mundo em muitas plataformas diferentes.
De quanto tempo precisas, em média?
Varia imenso consoante o género. Se for um anúncio, podemos ter entre 3 a 5 horas para colorir um anúncio de 30 a 60 segundos. Comédias vão de 6 a 9 horas. Documentários podem estar algures entre 8 e 16. Dramas normalmente são entre 16 a 24 horas. E depois as longas-metragens pode ser qualquer coisa entre uma semana e três semanas ou dois meses, dependendo do orçamento. Varia mesmo muito. A coisa mais engraçada é que quando estás a trabalhar num anúncio publicitário ou num vídeo musical, podes estar a fazer entre 50 a 100 cortes durante 3 ou 4 horas, e depois chegas a uma comédia e fazes 400 cortes e só demoras 6 horas. Estás a fazer muitos mais cortes e a extensão de tempo é quase a mesma. Só que não estás a fazer o mesmo nível de trabalho. Às vezes, quando estás a trabalhar num anúncio, vais estar a tentar reduzir escuridão debaixo dos olhos, fazer sobressair as cores dos olhos, fazer o cabelo brilhar, tornar o tom da pele mais leve… fazer muito mais trabalho de refinação, é algo muito mais trabalhoso do que simplesmente equilibrar sequências e fazer com que tudo tenha bom aspeto.
Que tipo de tecnologias poderiam existir no futuro para facilitar ou melhorar o trabalho de um colorista?
Com a invenção de ferramentas HDR… HDR faz a evolução de colorir, basicamente. É assim que conseguimos uma gama dinâmica de luz e cor muito mais ampla. Então, acho que certas ferramentas precisam de ser atualizadas, para nos permitir ter um controlo maior de áreas diferentes da imagem e uma resposta mais rápida. Talvez uma ferramenta que permita separar certos foot-lambert. É bastante técnico isto: nós medimos a luz na televisão em nits ou foot-lamberts. A definição padrão mais comum vai de 0 a 100, HDR vai de 0 a 1000 para a maioria dos ecrãs e depois, em Dolby Vision, vai de 0 a 10000. Gostava que algumas ferramentas nos permitissem isolar uma determinada área de forma mais rápida. Quer dizer, nós já o conseguimos fazer agora, só precisa de ser um pouco aperfeiçoado. Então, seria melhorar o conjunto de ferramentas que já temos. Depois, uma coisa que sempre quis poder fazer foi seguir rastos. Quero poder rodear uma forma e depois deixá-la perfeitamente localizada, sem ter de passar horas a mover pontinhos à sua volta para que encaixe perfeitamente. Tudo isto melhora de ano para ano, apesar de tudo, são tecnologias que estão em evolução permanente, e, à medida que os computadores melhoram, o software melhora também.
Há uma coisa que eu gosto muito de fazer – quando estou a trabalhar em documentários ou comédias, porque os orçamentos são baixos – que é poder integrar certos efeitos visuais. Tipo, poder fazer dias e noites: ser capaz de pegar numa imagem, arrastá-la e adicioná-la; adicionar luas, ou fazer uns pequenos truques às janelas, para poder criar noites a partir de dias facilmente, e fazê-lo de forma convincente. Gosto das ferramentas combinadas do software de colorista. Mas não quero tirar nada aos efeitos visuais, porque acho que é super importante os efeitos visuais serem feitos de forma correta e realista. E muitas ferramentas dos artistas de efeitos visuais estão a ser empurradas para as mãos dos coloristas, e muitas ferramentas dos coloristas estão a ser empurradas para as mãos dos efeitos visuais. E, embora ache que as linhas estão a ser diluídas, a verdade é que algumas capacidades estão a começar a ser desvalorizadas. É essencial usar um colorista para colorir e usar um artista de efeitos visuais para fazer efeitos visuais. E se precisares de recorrer ao pequeno velho efeito visual no departamento de coloração, tudo bem, e se precisares de recorrer ao pequeno velho detalhe de coloração no departamento de efeitos visuais, tudo bem também. Mas não tentem fazer das duas coisas a mesma. São ambas competências muito especializadas e acho que devemos garantir que se mantêm separadas à medida que evoluímos.
Como te envolveste com a Halo?
Eu comecei por arranjar o tal emprego num laboratório de fotografia. Lá, apaixonei-me por telecine, mas desde miúdo que sempre tive uma paixão muito grande por fotografia, andava com a câmara do meu pai para todo o lado. Mas, à medida que ia crescendo, quando comecei a evoluir nos estudos, não havia nenhum curso de multimédia, não havia grande conhecimento da indústria do cinema, ninguém falava disso. O público em geral não sabia nada sobre isso, honestamente; as pessoas iam ao cinema e viam um filme e era isso. E, quando comecei a trabalhar no laboratório, aprendi sobre várias coisas das quais gostava imenso e percebi que, um dia, podia fazer dessas paixões um emprego, que, um dia, até poderia virar uma carreira a sério. A partir daí, passei anos a investir o meu tempo pessoal em aprender, treinar, evoluir, a encontrar-me com pessoas da área depois do horário de trabalho e a observar o que elas faziam, e a crescer daí em diante. Quando comecei a arranjar projetos sozinho, passava imenso tempo a estudá-los, a praticar, a testar técnicas diferentes. O segredo é nunca parar de explorar… quer dizer, ando a fazê-lo há mais de 20 anos, e, sempre que tenho algum tempo livre, ainda o uso para brincar com ferramentas e testar ideias novas e ver o que de novo posso fazer. Observar o trabalho de outras pessoas, retirar inspiração disso. Acho que, se não fores vendo o trabalho dos teus pares, que modas andam por aí, o que tem mais sucesso, o que há de novo, acabas por estagnar. E quando ficas estagnado, acabas por ficar obsoleto. E isso não é nada bom.
Tu és o colorista sénior, portanto trabalhas com uma equipa.
Sim, é uma equipa. Somos três: eu, a Katherine Jamieson e o Paul Koren. Eu treinei-os aos dois na arte de colorir, mas a Katherine até entrou para a Halo antes de mim. Ela tinha uma paixão muito grande por colorir, entrou para a companhia e disse que queria ser colorista, e os diretores aceitaram a ideia e decidiram arranjar um colorista profissional, eu. Felizmente, ela tem um talento natural para colorir, o que nem sempre é o caso. Muitas pessoas até querem fazer o trabalho, mas não conseguem ver as inconsistências na cor e na luz e isso torna muito difícil acompanhar e treinar. Ela tem um olho excelente e o Paul também. E eu consegui treiná-los, então, agora, trabalhamos os três. Temos três estações para colorir, uma estação de assistência e até temos dois assistentes. A minha paixão por colorir também implica passar esse conhecimento em diante. É poder construir uma equipa da qual fico orgulhoso todos os dias. Quando vejo o trabalho que fazemos, fico com uma sensação de orgulho quase paternal; ajudei a “educá-los” numa arte e num ofício, que eles desenvolveram na sua própria arte, no seu próprio ofício e perseguem as suas próprias ideias. Trabalhar numa equipa também é muito bom para poder cruzar impressões e comparar ideias. Quando um de nós descobre uma técnica nova, partilha-a, e esse tipo de trabalho colaborativo ainda nos faz evoluir mais enquanto profissionais.