Há 94 anos nascia Eugénio de Andrade

por Joana de Sousa,    19 Janeiro, 2017
Há 94 anos nascia Eugénio de Andrade
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«Hoje roubei todas as rosas dos jardins
e cheguei ao pé de ti de mãos vazias.»

Há 94 anos nascia Eugénio de Andrade. Ao longo da sua vida privou com vários poetas e poetisas contudo seria, quando escrevia ainda os seus primeiros poemas, a introdução à obra de Fernando Pessoa que viria a despertar em si um incessável fascínio pela arte de escrever que viria a aperfeiçoar como poucos.

A 19 de Janeiro de 1923, nascia em Póvoa da Atalaia, no Fundão, José Fontinhas, que, anos mais tarde, viria a deixar a sua marca no mundo da Literatura com o pseudónimo, Eugénio de Andrade. Aos oito anos mudar-se-ia para a cidade de Castelo Branco e, mais tarde, já com 10 anos, acompanha a mãe para a Lisboa devido à separação dos pais.

Em Lisboa frequenta o Liceu Passos Manuel, começando a escrever os seus primeiros poemas no ano de 1936. Dois anos mais tarde, envia uma carta a António Botto, com alguns poemas de sua autoria e manifestando a sua vontade em conhecê-lo. É António Botto que introduz, então nesse encontro, a Eugénio de Andrade a poesia de Fernando Pessoa, que origina em Eugénio de Andrade um vastíssimo fascínio. Em 1942, dedica o seu primeiro livro, «Adolescente», à memória de Fernando Pessoa. Contudo, no ano de 1939, havera, incitado por António Botto, publicado uma obra intitulada «Narciso», ainda sob o nome de José Fontinhas. Apesar do inegável fascínio pela poesia de Fernando Pessoa, Eugénio de Andrade teve ainda uma grande influência de Cesário Verde na sua obra, contudo seria Camilo Pessanha que este viria a considerar como o seu «Mestre’.

«Quando a ternura
parece já do seu ofício fatigada,
e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas.»

O Silêncio
“Obscuro Domínio”, 1971

Em 1943, muda-se para Coimbra onde frequenta uma Licenciatura em Filosofia, que mais tarde vem a abandonar para se dedicar em pleno à escrita. Aí priva com vários poetas e poetisas de grande influência no panorama da Literatura em Portugal, nomeadamente, Miguel Torga, Mário Cesariny e Sophia de Mello Breyner Andresen. No ano de 1950 muda-se para a cidade do Porto e anos mais tarde faz amizade com outros autores consagrados como Teixeira de Pascoaes e Jorge de Sena. Em 1956, falece a sua mãe, figura central da sua obra.

Eugénio de Andrade faleceu a 13 de Junho de 2005, na cidade do Porto.

“Os navios existem, e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te… E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.”

Eugénio de Andrade
in “Poesia e Prosa”, 1989

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