‘Lust For Life’ reforça o apreço que se nutre por Lana
Aos 32 anos, Lana del Rey chega ao seu quarto álbum de estúdio, sendo o sucessor de “Born to Die” (2012), “Ultraviolence” (2014), e “Honeymoon” (2015). Para muitos, a californiana é uma das artistas de grande destaque desta década, tanto nas emoções desencadeadas, como na referência que assume ser para muitos. Para outros, é pouco mais do que uma cantora que não granjeia encantos e que não conquista pelo seu estilo musical. No entanto, e por mais que existam as cisões, é indiscutível o prestígio que Lana arrecadou até ao dia de hoje.
A cantora, na sua personalidade musical, é uma personalidade que consegue transportar os sentidos e a imaginação para aquilo que eram os intrigantes e inebriantes anos 50 e 60, na calha de uma contracultura que colocaria em alvoroço todos e quaisquer valores apadronizados e conotados. Com o glamour sempre associado ao seu traço artístico, este funde-se com o culminar trágico do romance, caraterística típica de vastas obras literárias e cinematográficas de então. No fundo, uma “Americarana” que surpreendeu nesta retrospetiva que, através dos recetores auditivos, conduziu os seus ouvintes a uma aura que causou sensação, sem nunca deixar de se munir de uma toada melancólica e nostálgica.
Com os sucessos consolidados de “Born to Die” – antecedido pelos arrebatadores singles “Video Games” e”Blue Jeans” – e de “Ultraviolence”, sentiu-se “Honeymoon” como o consolidar de um soundbyte que não causava o mesmo tipo de surpresa e de sensação como os seus antecessores. A irreverência com a qual os predecessores entraram nos seus contextos não foi a mesma, e o álbum não se tornou uma referência para os seus diversos fãs. As referências permaneciam as mesmas, distanciadas pelo tempo, mas nunca pela quantidade de reproduções que as suas faixas tiveram. Foi à luz deste desafio que se esfregaram as mãos pela chegada de um novo álbum, que prometia colaborações com artistas, como The Weeknd, A$AP Rocky, a vocalista dos Fleetwood Mac, Stevie Nicks, e o filho de John Lennon, Sean Lennon. Esta presença de músicos, cujas áreas de conforto se posicionam em vários géneros, indiciava a vontade de Lana incutir alguma novidade no seu álbum, embora sem nunca prescindir da identidade que tão bem resultou até ao momento.
A primeira faixa a ser lançada é, precisamente, aquela que consta no início deste trabalho discográfico, logo a seguir a “Love” (uma música que se arrasta e que se perpetua pelo coração com um traçado temporal desfragmentado mas adulado). “Lust for Life” é a homónima do álbum, e conta com o interessante contributo de The Weeknd, que confere uma consolidação muito razoável àquilo que é a harmonia em melancolia veiculada pela artista. O sorriso que esboça, e que figura na capa é, desta forma, um portal para uma dimensão sentimental mais profunda do que aquilo que a aparência pode enunciar e denunciar. Mais uma vez, a nostalgia conhece uma tónica bem sentida, tanto no plano sentimental, como no já aludido transporte para uma dimensão temporal que muitos não chegaram a viver fisicamente, inclusive a própria cantora.
As próprias temáticas não conhecem uma grande distinção, tornando-se num soundbyte que, apesar de repetitivo, se destaca por algumas faixas que prometem alojar-se no íntimo dos que mais acarinham a norte-americana, tais como “Love”, “13 Beaches“, ou “White Mustang” (uma boleia bem apanhada numa viatura que faz levitar). Uma premissa que acaba por resultar numa maior diferenciação em relação aos seus demais trabalhos são, evidentemente, as colaborações, que culminam em “Groupie Rock” – que também saiu em forma de single – e “Summer Bummer” com A$AP Rocky, numa fusão de rap que se torna peculiar no confronto complementar que cada forma de trovar a música traz à música, e em “Beautiful People Beautiful Problems“, com Stevie Nicks. Os próprios horizontes líricos também são amplificados, passando a abranger questões mais gerais e, de certa forma, interessantes de colocarem em perspetiva hoje (“God Bless The America – And All The Beautiful Women In It” e “When The World Was At War We Kept Dancing“).
Contempla-se dois terços de álbum em que o perfume de Lana se faz inalar pelos ouvidos, numa sinestesia bastante agradável, mas um último terço onde a disponibilidade não se torna a mesma, mesmo por essa rotinada e já sobejamente conhecida toada musical; apesar de ser um indicador que não se torna necessariamente mau para os que mais a apreciam. São músicas que não conseguem causar uma sensação de distinção e de marca, consumidas pela habitual introspeção, algo que as suas antecessoras conseguiram, e que estão longe de ficar no ouvido (exceção feita a “Tomorrow Never Came” e a “Heroin“). A avaliação qualitativa, no entanto, torna-se o menos importante, pois sente-se segurança e um corroborar de um trabalho feito até à data, apontado para compensar a intermitência de “Honeymoon”, e de conferir um pouco mais daquilo que a irreverência inicial foi capaz de transmitir. Distante do impacto causado por “Born to Die”, não fica muito atrás do potencial furor que as suas músicas podem gerar em relação às de “Ultraviolence”, em especial dado às bem-sucedidas experimentações feitas pela cantora com vários outros músicos.
Em “Lust For Life”, Lana del Rey proporciona mais um trabalho que avoluma e consolida uma identidade musical muito afincada e apreciada por muitos daqueles que se deleitam pela música desta década. A necessidade de prover o seu trabalho com alguma novidade desemboca nas colaborações que oferece na extensão do presente álbum, que resultam, sem mácula, numa réplica positiva ao fantasma de “Honeymoon”, que ainda paira um pouco na parte final. No entanto, não é isso que retira méritos e créditos a um álbum que resulta e que cumpre no reforçar de uma artista sem medo de arriscar, e que tira o maior proveito de uma identidade de lustrosa sensibilidade.