Maior festival de cinema independente da China suspenso por pressão política
No ano passado o China Independent Film Festival (CIFF) acabou por não se realizar por problemas com questões de regulação e foi encerrado pelas autoridades chinesas várias vezes nos últimos 17 anos.
O festival foi “interrompido indefinidamente“, disseram os responsáveis em comunicado. A organização revelou ainda que se tornou “impossível” realizar o evento no actual contexto político do país.
“Para o Partido Comunista a cultura tem sido usada como o “poder brando” que é tão poderoso quanto qualquer arma no campo de batalha política e económica internacional.“, disse em 2019 o artista e activista chinês Ai Weiwei.
É de relembrar que no passado dia 9 de Janeiro a CNN revelou que a China proibiu materiais de ensino estrangeiro no sistema de ensino do país. Livros didácticos estrangeiros ou literatura clássica estrangeira são dois exemplos de materiais que serão excluídos das escolas públicas primárias e secundárias — nestas últimas, há excepções em escolas que tenham aulas em conjunto com instituições de ensino estrangeiras,
O Ministério da Educação Chinês anunciou também que irá reforçar o sistema de revisão do ensino para que todos os materiais que contenham “problemas de direcção política ou orientação de valores” não sejam aprovados no futuro. Materiais com assuntos com fortes princípios ideológicos, como soberania, nação e religião, serão escritos e distribuídos directamente nas escolas, revela ainda a notícia da CNN.
Recentemente, o arquitecto, artista plástico, pintor e activista chinês Ai Weiwei afirmou que “Toda a indústria cinematográfica é manipulada na China. É a maior máquina de censura do séc. XXI” e que “Cada linha de texto, cada frame, é fortemente censurado. Todos os dias a China se torna mais forte no controlo das ideologias das pessoas e na distorção das informações, promovendo um entretenimento puro, desprovido de conteúdo estético ou profundamente filosófico“, acrescentou ainda o artista.
Ainda relativamente ao China Independent Film Festival, este teve 14 edições e exibiu cerca de 1000 filmes desde que foi criado em 2003, em Nanjing, na capital da província oriental de Jiangsu. Muitas das obras destacadas no festival abordaram temas como homossexualidade ou história política, temas considerados sensíveis ou inadequados pelo Partido Comunista da China. Outros filmes eram efectivamente títulos clandestinos, e censurados pelo Governo, pois careciam do “selo do dragão”. A aprovação necessária para exibição pública da obra.
“Acreditamos que, dadas as actuais circunstâncias organizacionais locais, já se tornou impossível organizar um festival de cinema que realmente tenha um espírito puramente independente e que também seja eficaz“, disseram ainda em comunicado os responsáveis do festival de cinema. Apesar das palavras duras dos organizadores estes não procuram difamar ou pressionar outros festivais que continuam a realizar-se no país: “É claro que ainda respeitamos os festivais de cinema locais que fazem o possível para incentivar um espírito independente sob uma máscara de segurança“.
Na sua última edição, 2017/2018, o China Independent Film Festival concedeu seu principal prémio à longa-metragem “Shanghai Without Sadness”, a estreia de Yang Mingteng na realização. Já o prémio do júri de longa-metragem foi entregue a “Taming the Horse”, de Gu Tao, um documentário sobre um jovem migrante da Mongólia que se muda para a capital do sudoeste de Kunming, no sul da China.
O crítico e professor Zhang Xianmin, um dos principais organizadores do festival, disse ao jornal South China Morning Post, de Hong Kong, que “Estamos de volta às regras usadas anteriormente pelo Partido Comunista. Recuámos 20 anos, quando não havia espaço ou oportunidade para filmes independentes.”