“O Farol”, de Robert Eggers: o terror do silêncio
O novo filme de Robert Eggers, O Farol, chegou esta semana aos ecrãs portugueses, após ter conquistado uma nomeação nos Óscares, e o que não faltam são razões para ires de imediato comprar os bilhetes para o cinema.
O realizador de The Witch, Robert Eggers, apresentou aquele que é, sem grandes dúvidas, o marco da sua carreira, algo que felizmente poderá partilhar com Robbert Pattinson, que alcança o auge das suas interpretações e que lhe poderia – honestamente – ter rendido uma justa nomeação ao Óscar de Melhor Ator. Mas, justiças e injustiças à parte, O Farol (ou The Lighthouse) é um daqueles filmes estranhos que, por alguma razão, não nos deixa desistir. Diria que é a versão cinematográfica de Edgar Allan Poe. Enigmático, misterioso e assustador, sem nunca deixar de ser encantador.
O Farol narra a história de dois faroleiros no final do século XIX, que lutam para manter a sanidade num mundo que vive mergulhado na beleza de viver enquanto Thomas Wake (Willem Dafoe) e Thomas Howard (Robert Pattinson) tentam sobreviver à solidão na assombrosa ilha do farol.
Howard é de poucas conversas. Vive fechado no seu mundo e na sua própria sombra. Porém, Wake não se cansa de falar e de perturbar a tão pequena paz que o seu homónimo ainda tem no (demasiado) sossegado farol, o que aos poucos, o obriga a sair da sua zona de conforto. Afinal de contas, gerir um farol não é tarefa para um só homem… Mas ambos vão desejar que fosse. À medida que a obra avança, Howard não só se liberta do casulo onde vivia, como também deixa todas as suas frustrações conhecerem o exterior de si próprio, libertando-se dos demónios interiores que o perturbavam, apenas para se transformar na personificação de todas as suas sombras. O trabalho de Rober Pattinson é magistral, desde o primeiro momento. Willem Dafoe é já um ator consagrado, mas é Pattinson quem ilumina o farol, viajando por todas as emoções que o ser humano consegue sentir, desde o mais curto momento de calma à loucura incontrolável de um monstro.
O Farol é construído de forma psicológica, passeando-se pelo horror, pelo drama, mas também pela comédia. Não diretamente pela força engraçada das personagens, mas pelas situações que, por vezes, ajudam a alisar os momentos tensos, mesmo que o realizador o faça como uma espécie de presságio para o terror que nos aguarda mais à frente. Porém, não me atrevo a considerar O Farol um filme profundamente assustador, uma vez que se prende ao cais do género e não se permite entrar em alto-mar, ficando-se pela tensão construída e acumulada que, sem grande esforço, nos deixa desconfortáveis em grande escala. O que, para minha surpresa, nunca me aborreceu. Em nenhum momento da sua duração a obra de Eggers se torna cansativa.
A nível técnico, The Lighthouse é ousado e parece viajar no tempo. Centrado no objetivo de parecer antigo, o trabalho de realização, o vestuário e a produção artística trabalharam de mãos dadas para nos dar uma obra que, segundo o cinematógrafo, Jarin Blaschke, tinha o objetivo de “nos fazer viajar até ao passado (…)” e também parecer “o século XIX, mas também a década de 30. Na verdade, tem de dar a impressão de que saiu dentro de nós próprios“.
O Farol é uma obra-prima. Atrevo-me a dizer que não será um filme para todos, mas é sem dúvida um filme que irá conquistar qualquer um que se deixa livre para ser abalado pela obra de Robert Eggers. E vale a pena ser visto no cinema.
Esta crítica foi escrita por Miguel Santos e foi originalmente publicada em Espalha Factos.