Oportunidades perdidas
Já que a história é longa e aborrecida, que fique bem contada. Há quem diga que o novo modelo de apoio às artes resulta de um diálogo próximo com a comunidade artística, que terá tido várias oportunidades de se manifestar. Não é bem assim. Quase um ano depois da nomeação dos actuais responsáveis do Ministério da Cultura, em Abril de 2016, foi dirigido a várias estruturas um inquérito cujas conclusões, algo vagas, foram mais tarde apresentadas em simultâneo com a proposta do novo modelo de apoio. As apresentações tiveram lugar em cinco cidades entre 10 e 13 de Julho (as estruturas foram convocadas no dia 7). O “novo modelo de apoio às artes” foi apresentado em linhas tão gerais que não havia muito a contestar, a não ser precisamente o seu grau de indefinição. Não surpreende, por isso, que a portaria que viria mais tarde a estar em fase de discussão pública, igualmente vaga, não tenha suscitado oposição.
Ainda assim, na sessão pública de apresentação do novo modelo, foram enunciados princípios que não viriam a ser cumpridos: “simplificar procedimentos” (complicaram); “estimular estratégias de desenvolvimento local” (houve cidades varridas do mapa); “os projetos são muito distintos entre si e trazem desafios e necessidades bem diversos, que carecem de respostas ajustadas” (foi tudo pela mesma bitola dentro dos mesmos concursos, grandes e pequenos projectos, estruturas de criação e de programação, vocacionadas para a circulação ou para o trabalho com comunidades locais – houve quem desenvolvesse trabalho especificamente local e fosse penalizado por não o internacionalizar…); “os processos concursais abrem na 2ª quinzena de setembro” (abriram um mês depois) e “são dirigidos a apoios sustentados, para 4 e para 2 anos; no início de 2018, estas entidades receberão os respetivos apoios” (dependendo do concurso, chegarão em Maio ou Junho); “vamos solicitar o envolvimento de representantes do sector das artes e assumir uma metodologia participada, queremos começar a fazê-lo no último trimestre deste ano, de modo a fixar o Plano Estratégico em 2018” (não sei se há quem saiba disto). Tudo isto são citações da comunicação pública então lida pelo secretário de Estado da Cultura no TNDMII, disponível no site da DGArtes.
Foi preciso esperar pelo dia de abertura de cada concurso para passar a haver detalhe: regulamentos, critérios de avaliação, dotação orçamental, informação a incluir, documentação exigida. Numa nova plataforma, só então conhecida, mais complexa do que a anterior, com mais informação obrigatória e com falhas – assumidas – que duraram até ao último dia de entrega. Foi um sucesso? Não foi. A participação no concurso serve de validação do modelo por parte das estruturas? Não serve. Podia ter havido um verdadeiro envolvimento da comunidade artística na reformulação do modelo de apoio? Podia. Esperemos que na próxima seja possível, e esperemos que esteja para breve.
Crónica de Pedro Jordão