Quando o coronavírus chegar a Portugal não será o fim do mundo
Há aqui dois cenários a ter em conta, o A) é o momento em que estamos, em que nos preparamos para um primeiro caso, ou meia dúzia de primeiros casos, e o B) é quando já for difícil ou impossível distinguir e isolar o número de casos.
Tudo indica que o coronavírus vá chegar a Portugal, por isso mentalizem-se e tranquilizem-se em relação a esse facto. Não é o fim do mundo. Tentem passar rapidamente da fase da emoção à fase da razão.
— Os vírus são por norma difíceis de tratar e este que se saiba ainda não tem tratamento. O que quer dizer que é o nosso organismo, o nosso sistema imune, que aos poucos vai dando conta do recado. Mas ainda é cedo, a qualquer momento pode surgir um antivírico eficaz.
— Os sintomas são no geral como uma gripe, pelo que são difíceis de diferenciar principalmente nesta fase do ano.
— A mortalidade do que se sabe da China é de cerca de 2 a 4%, e fora da região de Wuhan é de 0,7%. Isto provavelmente traduz a pressão que os cuidados de saúde sofreram. Ou seja em condições normais a mortalidade é muito baixa.
— A mortalidade está claramente relacionada com a idade, sendo os idosos os mais vulneráveis. Ainda não há nenhuma criança abaixo dos 9 anos que tenha morrido, abaixo dos 40 há muito poucos casos de morte, e é a partir dos 60 que começa a aumentar.
— Por estranho que pareça, gerir o A) é mais causador de pânico do que gerir o B) . No B) a opinião pública adapta-se, e os profissionais de saúde normalizam as suas práticas adaptados à realidade e seguimos caminho.
— Os casos mais graves são uma pequeníssima minoria, e precisam de cuidados intensivos e de ventiladores (aparelho que respira por nós). E é aqui que o sistema de saúde pode encontrar o seu afunilamento, em termos de material e recursos humanos. Mas mesmo em Wuhan, e apanhados de surpresa, conseguiram de alguma forma adaptar-se às necessidades. Longe do ideal mas razoável pelo que se sabe.
— Mais uma vez (na minha opinião) se levanta a questão: que nunca há tudo para todos, pelo que uma gestão cuidada e criteriosa é fulcral. Já é o que é feito só tem é de ser adaptado a uma nova realidade.
— Numa situação B) pode ser sensato evitar grandes multidões por uma questão de probabilidade de contacto. E seguir, claro, as instruções da Direcção Geral de Saúde.
— As máscaras que por aí vemos conferem alguma protecção, mas na minha opinião parece-me totalmente supérfluo que nosso dia a dia sejam necessárias. Na aproximação de uma caso confirmado, aí sem dúvida que sim. Nada de pânicos aqui.
— Se tem sintomas de gripe e esteve em alguma zona de risco, ou em contacto com pessoas com a doença confirmada o ideal é ligar o 112 ou o Saúde 24, e aguardar por instruções sem sair de casa. É melhor para si e para os outros.
Mais uma vez se prova que as fronteiras são fictícias, e é imperativo olhar para a humanidade como um todo, para o bem e para o mal, somos todos da mesma família. E, se não for muito incómodo, pensem também nas doenças que matam milhões e que são facilmente tratáveis e que só não estão no nosso pensamento porque só matam noutros locais do planeta.
Assumam que o coronavírus vai chegar e tranquilizem-se. Não é a primeira nem a última pandemia das nossas vidas. Agreguem informação fidedigna, tomem as devidas precauções mas não se esqueçam que o pânico pode matar mais que a própria doença, que, felizmente, mata pouco.
Texto de Gustavo Carona
O Gustavo tem 39 anos é do Porto e é médico Anestesista e Intensivista. Já fez 13 missões humanitárias e escreveu o livro “O Mundo Precisa de Saber”.