“Sibyl”, de Justine Triet: nem tudo o que parece é
Selecionado para a Competição Oficial do Festival de Cannes, Sibyl integrou a secção Fora de Competição do Lisbon & Sintra Film Festival.
Sibyl (Virginie Efira, extraordinária) é uma psicanalista que decide largar a maioria dos seus pacientes quando é tomada pelo desejo de escrever, procurando inspiração em Margot (Adèle Exarchopolous), uma jovem actriz que lhe suplica que a receba. Em pleno período de filmagens, Margot engravidou do actor principal (Gaspar Ulliel), que mantém uma relação com a realizadora do filme (Sandra Hüller). Sim, o enredo parece saído de uma qualquer telenovela mexicana (sem desprimor), mas são exatamente as características melodramáticas da história que a realizadora pretende decompor. Com esse intuito, Triet faz-se valer das circunstâncias associadas às filmagens, para nublar a linha que separa a realidade da ficção, onde os papéis desempenhados pelos atores do filme dentro do filme se misturam com as suas próprias vidas.
Como várias leituras da obra sugerem, Sibyl corre o risco de ser desvalorizado, pelo seu argumento intrincado e submissão aos clichés da comédia dramática francesa, um relato pretensioso da classe média/alta. Mas é dissimulado nesta aparência, que a obra se revela detentora de diversas camadas, exploradas pela realizadora, balanceando astutamente o elemento trágico e cómico da narrativa.
A protagonista lida com o alcoolismo da mesma forma que o filme, criando máscaras que camuflam a sua verdadeira identidade, ficções que habita, escudando-se das suas inseguranças. É esta correspondência que se vai delineando entre o psicológico da protagonista e o enredo do filme, que nos vai progressivamente impressionando e comovendo. Sibyl alimenta-se das tragédias de outrem, como elixir para a sua dependência, procurando libertar-se da sua psicose por intermédio da escrita.
Justine Triet não tem medo de abraçar o absurdo, aumentando, sem receios, o tom satírico da trama, criando situações cada vez mais insólitas para os seus personagens. Num filme sobre representações, convém sublinhar o admirável trabalho de todo o elenco, enfrentando este baile de máscaras com desenvoltura. Depois de La Bataille de Solférino (2013) e Victoria (2016), a cineasta continua a estabelecer-se como um nome a seguir no panorama cinematográfico francês, revelando um salutar controlo sobre os elementos em cena, subvertendo os estereótipos associados ao cinema do seu país.
Sibyl estreia hoje (28 de novembro) no Cineplace Nova Arcada – Braga, no Espaço Nimas – Lisboa e no Cinema Trindade – Porto.