‘The Hitman’s Bodyguard’, um entretenimento de Verão onde o carisma da comédia suplanta o da acção
Há filmes que servem para aquilo que The Hitman’s Bodyguard serve: puro entretenimento descomprometido de Verão. Ainda assim, dentro desse leque de filmes, há formas e formas de fazer cinema de entretenimento descomprometido, e não nos parece que a sazonalidade seja desculpa suficiente para que um filme não tente, pelo menos a espaços, fazer algo mais que o expectável e genérico. Em princípio, o cinema é feito para ser visto numa sala de cinema, mas o novo filme de Samuel L. Jackson e Ryan Reynolds parece, às vezes, preferir ser feito para ser visto em viagens de avião de longo curso, e o espectro do tal cinema de entretenimento descomprometido de Verão não significa, por si só, que não possa existir um pouco mais de esforço. Parece, também, que há algo de errado no tratamento de imagem, com um brilho estranho que tira resolução e qualidade à imagem, e ainda um CGI bastante duvidoso (afinal de contas, estamos em 2017, e este é um filme de grande orçamento).
Talvez estejamos a ser demasiado duros. The Hitman’s Bodyguard até tem bons momentos dentro da sua segurança, e regras predefinidas, mas não são suficientes quando existem outros em maior quantidade que são francamente desinspirados. Torna-se algo frustrante q.b. quando o talento dos dois protagonistas, e de uma terceira, Salma Hayek, chega e sobra para fazer algo bem mais carismático. Infelizmente, o argumento não lhes dá o espaço necessário, e, quando escolhe afastar-se do registo comédia para a acção, esta tem tão pouca alma que dá vontade de pegar num comando, e chegar à frente, como é o caso da perseguição pelos canais de Amesterdão, onde Ryan Reynolds (na realidade, um seu duplo que nunca tira o capacete, talvez para poupar na montagem do filme) conduz uma mota pelas margens, protegendo o seu co-protagonista, que foge numa lancheira, enquanto os gangsters o perseguem.
Para tentar contrariar a manifesta falta de interesse, ritmo e (ausência de) coreografia das sequências de acção, o realizador opta por disfarçar com alguma violência (estilo melancia a rebentar), que faz subir a sobrancelha de desconfiança e, perto do final, decide, do nada, filmar um long take de luta corpo a corpo que faz subir ambas as sobrancelhas de espanto. Onde andou esta ideia antes ao longo de todo o filme? The Hitman’s Bodyguard decide, depois, ainda dificultar mais as coisas para si próprio, introduzindo alguns temas políticos sérios num filme que já era desequilibrado entre a comédia e a acção, o que, para ser feito com este nível de superficialidade, mais vale estar quieto, com um Gary Oldman, na sua cena introdutória, a fazer de Christoph Waltz na cena inicial de Inglorious Basterds, versão saldos (portanto, Verão).
O humor, apesar de (outra vez) genérico e mesmo algo repetitivo, tem bons momentos que vivem em igual medida do carisma dos protagonistas e do humor de situação, e há, assim de repente, três grandes gargalhadas a dar. Tudo isto é suficiente para pagar pelo bilhete de cinema, mas este não é, e, pelos vistos, prefere não ser, um filme de entretenimento com substância suficiente para se distinguir dos seus inúmeros pares, como o fizeram recentemente em filmes, como The Nice Guys.
Porque é bom: Alguns bons momentos de humor de situação e diálogo; a presença de um Samuel L. Jackson expansivo, ainda que limitado pelo argumento; entretenimento descomprometido, que entrega aquilo que promete; um bela sequência de acção perto do final; o filme nunca é realmente mau, mas também nunca é realmente bom.
Porque é mau: A introdução desnecessária de temas políticos sérios, num filme, já por si, desequilibrado entre acção e comédia; um love interest desinspirado e desinteressante do lado de Reynolds, com outro que é o exacto oposto em relação a Jackson e Salma Hayek; as cenas de acção são demasiado preguiçosas e genéricas, optando o realizador por uma pitada de violência algo gratuita para disfarçar a coisa.
Crítica também publicada em The Fading Cam