Tuning In/Sounding out: um exercício de vulnerabilidade no MAAT
Há muito que o MAAT (Lisboa) é mais do que um museu, é um local de cogitação, onde as iniciativas, instalações e exposições nos dão uma visão acutilante do mundo em que vivemos. Tivemos recentemente, e a título de exemplo, a exposição Earth Bits – Sentir o Planeta, na qual era possível medir a pegada de carbono de cada um e calcular de que forma como contribuímos para as alterações climáticas, mas também é frequente termos debates e exposições que abordam temas tão fracturantes como necessários, como o colonialismo, o racismo e a desigualdade.
A iniciativa Tuning In e Sounding Out não é diferente. Pensada muito antes da pandemia de 2020 (que se arrasta), coloca-nos como Seres Vulneráveis, a vulnerabilidade do existir como seres humanos, dos não-humanos e da natureza. Com a curadoria de Andrea Bagnato e Ivan L. Munuera, esta iniciativa que se divide em dois fins-de-semana traz-nos desconforto, inquietação, e uma vontade profunda de reflectir sobre quem somos e sobre tudo o que nos rodeia.
O primeiro fim-de-semana — Tuning In — foi, como nos disse Andrea Bagnato, “pensado de uma forma muito literal, como quando se sintoniza a rádio”. Os temas abordados são transdisciplinares, se por um lado temos a forma como até mesmo a plantação colonial de cana-de-açúcar teve impacto na forma como a febre amarela se alastrou no mundo, numa leitura performativa de Vivian Caccuri, por outro tivemos “aulas” de História que nos foram mostrando a forma como o confinamento tem vindo a ser, ao longo dos tempos, uma forma de controlo de doença e como “as comunidades marginalizadas foram particularmente afetadas por formas de exclusão sistémicas e estruturais”, numa conversa entre Marina Otero Verzier e Rachaporn Choochuey.
O cinema e a imagem estiveram também presentes, quer com a mostra da curta de Last Address de Ira Sachs ou de Celaje, de Sofia Gallisa Muriente. Muriente esteve também presente na conversa “Vulnerable Memory”, com exemplo do controlo de Porto Rico, um território marcado pela vulnerabilidade da ocupação ao longo dos tempos.
Na entrevista aos curadores, que realizámos dias antes de Tuning In, vislumbrámos o que poderíamos presenciar e reflectir, mas de facto há muito mais do que apenas uma aula de História ou de Medicina. Há a forma como nos comportamos perante ameaças de saúde, mas não retrocedemos (plural majestático) quando é necessário questionar a individualidade para abraçarmos o colectivo. Continuaremos neste desafio de nos questionarmos enquanto indivíduos e enquanto sociedade no próximo fim-de-semana, com a segunda parte da iniciativa “Sounding out”. Fá-lo-emos num exercício de humildade e de estudo, para que possamos explorar, “entre outros temas, vulnerabilidades e codependências invisíveis, a condição de “selvagem” como possível contraponto às narrativas de exclusão, o modo como as instituições legitimam (mas também confrontam) o conhecimento científico, as tradições distantes do cânone ocidental onde o sentido de comunidade é mais inclusivo, a violência estrutural na formação dos estados-nação, e as genealogias do ativismo.”