Unknown Mortal Orchestra continuam a ser os mesmos “funny friends” de sempre
Lá fora, fazia um frio de rachar. A segunda-feira era de chuva, que já antes havia dado os primeiros avisos, mas que viria a intensificar-se minutos depois das 20h00, levando a que as pessoas se munissem dos seus guarda-chuvas e sprintassem pelas míticas escadas de acesso ao Hard Club, qual Rocky Balboa. Muitos eram os que se queixavam do gelo enquanto tentavam secar os cabelos encharcados, e outros tantos iam sacando do casaco extra que traziam na mochila para se aquecerem. Isto até a festa começar, claro; em dia de regresso dos Unknown Mortal Orchestra à cidade do Porto – apenas quatro meses depois de passarem pelo NOS Primavera Sound – o frio foi logo esquecido por quem respondeu ao concerto da banda de Ruban Nielson com danças intermináveis.
Sex & Food é o novo disco do grupo e, nos seus melhores momentos, pede mesmo isso: uma dança colectiva e contagiante, que não tem hora marcada para acabar. Não foi, contudo, só do álbum saído em Abril que se escreveu a história deste concerto, dado num Hard Club que se encheu para matar as saudades; a banda também regressou ao seu passado diversas vezes, e reinventou-o conforme quis.
“From The Sun” foi o tema que deu o arranque; a sinergia que une os Unknown Mortal Orchestra ao seu público revelou-se logo nos segundos iniciais, com uma grande onda de aplausos a abraçar os primeiros acordes de guitarra soados, e tornou-se ainda mais evidente quando Ruban decidiu sair do palco para tocar o seu solo à beira dos fãs. É fácil reconhecer o espanto e entusiasmo estampados nos rostos de quem viveu aquele momento e percebeu a sua preciosidade; o tímido, mas alegre Ruban ia respondendo com sorrisos, naquela sua postura quase cool sem esforço, e percorreu as fileiras do recinto como se estivesse em casa.
Daí o grupo passou para a sempre incrível “FFunny FFriends” e para os tempos em que os Unknown Mortal Orchestra eram apenas e só Ruban Nielson, sozinho no seu quarto, a tentar criar um som ao mesmo tempo retro e moderno e a lançar faixas no Bandcamp anonimamente. Passaram-se 7 anos desde que “FFunny FFriends” foi escrita; 7 anos de um pequeno projecto que conseguiu passar da fase “internet hype” para a fase “tour mundial” sem perder a sua integridade artística – e também sem estagnar.
Hoje em dia, Ruban não anda tão sozinho. Agora, o irmão Kody acompanha-o na bateria, e até o pai Chris está na estrada, ficando a cargo do saxofone. Foi ele quem roubou todas as atenções no fim de “So Good At Being In Trouble”, música que foi transformada numa jam caótica de free jazz no concerto de segunda-feira. Depois, claro, há o baixista Jacob Portrait, que já há muito que é um elemento absolutamente fulcral no universo dos Unknown Mortal Orchestra.
Esse universo é um em que cabe tanto o seu pop denso e psicadélico, como o amor que nutrem pelo noise rock sujo ou pelos ritmos do funk e disco. Isso explica a diversidade que os fãs puderam apreciar no concerto: uma acelerada “Swim and Sleep (Like a Shark)” e a nova “American Guilt” contrastaram belissimamente com músicas mais ligeiras e soltas como “Not In Love We’re Just High” ou “Multi-Love”. Já as deliciosas “Hunnybee” e “Everyone Acts Crazy Nowadays” ficaram guardadas para o encore – onde ainda houve tempo para “Can’t Keep Checking My Phone” – e permitiram a consagração da banda na noite. As danças foram uma constante, e entre elas ficou a certeza: Ruban já tem mais uns anos em cima e passou por muito desde que o conhecemos pela primeira vez… mas continua a ser o mesmo rapaz atento e inteligente de sempre.