Quarentena. Eles estão no meio de nós
Rui Cruz é humorista, stand up comedian e um génio (palavras dele). Escreve coisas que vê e sente e tenta com isso cultivar o pedantismo intelectual que é tão bem visto na comunidade artística.
Depois da ameaça de terceira guerra mundial, dos fogos na Austrália, da pandemia, das tensões na UE, do vulcão Krakatoa ter entrado em erupção e do Brexit, temos agora o Pentágono a libertar vídeos oficiais de OVNIS. Incrível… Este ano já viu mais acção do que a cama de muita prostituta. Aliás, 2020 nem é bem um ano, é um disaster movie escrito por um cocainado com déficit de atenção que encontrou metanfetaminas no casaco e vive com o Charlie Sheen. Está tudo a acontecer! Hoje, por exemplo. Ligo a TV à tarde e qual é a primeira coisa que vejo? O Frederico Varandas de camuflado da tropa e bóina. Nada faz sentido. A continuar assim, não acaba o ano sem descobrirmos que a Arca da Aliança está enterrada em Fernão Ferro e que o Inri Cristo é o Banksy. Mas é verdade, o Pentágono confirmou que os vídeos que circulavam há uns tempos na net e que mostram imagens de objectos voadores não identificados são verdadeiros e que são resultado de uma fuga de informação. Bonito… Como se a malta das teorias da conspiração já não tivesse mais o que fazer com o 5G…
Confesso que a existência de Aliens sempre me fascinou, principalmente porque vejo o Canal História e, segundo eles, os extraterrestres inventaram tudo, das pirâmides à posição de trinco no futebol moderno. Para além disso, venho de Arganil e quem conhece bem os meandros da internet sabe o que isso significa… (quem não conhece que vá ao youtube e escreva “O Profeta Extraterreste de Arganil”. De nada.) No entanto, agora que pela primeira vez temos a confirmação de algo que pode indicar vida noutros planetas, dou por mim pouco entusiasmado. Não estou satisfeito. Primeiro porque acho absurdo esses OVNIS andarem por aí a voar sem poisarem e consumirem alguma coisa. Quer dizer, de repente os ETs são aqueles tipos sem noção que se sentam na esplanada do café a fumar e a conversar sem comprarem nada! A seguir vem o quê, pedirem a chave do planeta para irem aliviar a tripa ao Grand Canyon e à saída perguntarem se dá para trocar uma nota de 50 Darseks para o parquímetro em Júpiter? Assim não… Esperava mais educação de malta que consegue viajar à velocidade da luz e não tem funk brasileiro. Ou se calhar tem, já não digo nada. Vai-se a ver e há uma versão qualquer de Funk Dolnarq em que os aliens abanam as 8 nádegas ao som de “vou poisar no teu tripod e os teus tentáculos são o que me fod…”. Bom. Depois porque um dos vídeos é de 2004. Pois é… e todos sabemos o que aconteceu em 2004, não é? Quem me garante agora que o Ricardo não falhou aquela saída ao Charisteas porque se distraiu a olhar para um charuto às voltas no céu? Quem me diz que o Costinha não foi raptado na noite anterior e trocado por um robot incompetente? Isso explica aquelas roupas e tudo!
Mas mais do que isto, o que me deixa assim meio mortiço é saber que, a haver mesmo vida extraterrestre, estes tipos andaram milhões do quilómetros para chegarem aqui e o que nós temos para lhes mostrar é um planeta poluído, exploração do semelhante, lideranças fracas e muitas vezes ignorantes, guerras, doenças e aquele vídeo do gato a tocar piano no YouTube. Não pode ser. É por isso que acho que temos de fazer alguma coisa épica para receber os nossos “novos amigos” e mostrar que este planeta vale a pena. E como estamos em Portugal, nada mais simples: proponho o maior arroz de cabidela do mundo no aeroporto de Lisboa. Um arroz de cabidela que se consiga cheirar desde os anéis de Saturno e que faça corar de vergonha a feijoada da Ponte Vasco da Gama e as pessoas que tiveram essa brilhante ideia. Pelo menos uma vez na vida. Vamos, pessoal, Maio está aí a chegar e “eles” também, é meter as mãos à obra, até porque com sorte e com um copito a mais ainda os convencemos a investir na TAP. E é por isto que eu um dia vou ser presidente.
Se acharam tudo isto estranho, não se preocupem. É que citando um grande sábio “foi isto. Não fui eu a falar.”
Aqui ficam as sugestões do dia:
Comédia:
Ellen Degeneres – Here and Now
Música:
The Smashing Pumpkins – Siamese Dream
Cinema:
Mike Judge – Idiocracy
Literatura:
Milan Kundera – A Lentidão