“Este Lugar Não Existe”, Herberto Helder (poesia)
Podemos, de vez em quando, conviver com uma realidade que não é a de todos os dias. Começamos a contrariar o que achamos do mundo, pensamos que talvez o mundo não seja feito das certezas que dele temos, mas da dedução do que, por sinais, nos dá a conhecer. Há uns dias reuni alguns dos actores que participarão nos vídeos do Dizedor. Reunimo-nos para gravar este vídeo. Foi comovente ver como aderiram a uma ideia tão incerta – uma ideia, apenas. Pedia-lhes que não fizessem nada, que estivessem voltados para si-mesmos. Contava ideias que tinha para os outros vídeos, o porquê de estarem agora ali, o porquê de não estarem as outras pessoas. Pedia-lhes isso e desconsolava-me o pedir uma tão pouca coisa. Falava de espectros, de quadros, de poesia. Tive a brilhante sorte de ter comigo neste barco um conjunto de pessoas que são a maravilha na maravilha. E até o Sr. Donato aceitou ficar atrás do balcão para o vídeo.
Gravámos no Sport Clube das Amoreiras, e antes de chegarem os actores estava eu, com quem no café estava, a assistir a um jogo de futebol.
O vídeo tem como mote um poema do Herberto – sobre quem não falarei muito, por falta de atrevimento. Uso-o como dica para o que é o Dizedor: este lugar não existe, realmente – estamos a filmar lugares impossíveis, pessoas impossíveis, símbolos ou sinais. De um postal onde vemos a Ilha dos Mortos, de Arnold Böcklin, passamos para o que pode muito bem ser um postal do inferno, da morte, do desencontro em si. Não é tema alheio a Herberto, esta coisa de se morrer: desde novo que foi sempre adiando a morte, sentimo-lo, sabemo-lo pela sua poesia.