Jungle ao vivo: o calor vulcânico da música de dança carregada de soul
Os Jungle são presença assídua em Portugal. Desde 2014, ano no qual lançaram o seu álbum de estreia homónimo, até ao passado dia 29 de Outubro, já haviam actuado no nosso país 7 vezes, mas sempre em contexto de festivais de música. Foi preciso esperar até à mega tour que estão a fazer em suporte do seu quarto álbum, Volcano, para recebermos a banda num concerto em nome próprio. O gáudio dos fãs do neo soul do septeto britânico em Portugal manifestou-se sob a forma de um Campo Pequeno completamente esgotado há dois meses.
Ainda antes dos autores de “Busy Earnin’” subirem ao palco, quem o tomou foi Sam Eastgate, mais conhecido por ser metade do duo Soft Hair e, a solo, como LA Priest. Apresentou-se em formato one man band, manobrando pedais, sintetizadores de percussão e uma guitarra, que usou para tentar replicar o seu funk alienígena ao vivo. As batidas repetitivas e soluçantes de canções como “It’s You” ou “What Moves” foram pouco adequadas para o ambiente fervilhante de quem esperava dançar ao som da música muito mais animada dos Jungle, perdendo-se no enorme espaço do Campo Pequeno.
À hora certa, como dita a pontualidade britânica, ouviram-se as primeiras notas de “Us Against the World”, canção que também abre Volcano, e se alguém ainda estava sentado nas bancadas repletas de gente, não voltou a fazê-lo até ao final do concerto. Apesar de a canção apenas ter sido lançada há nem três meses, já dá ares de ser um clássico dos Jungle. A sua letra motivadora e produção que coloca a voz na frente da mistura de som é feita para nos fazer sentir invencíveis, algo que experimentamos à medida que vamos gritando “Step to the world / It’s us against the world”.
Daí para a frente, o ritmo não diminuiu muito mais que isso. É que, apesar de os Jungle se movimentarem por vários géneros em estúdio, reproduzindo-os de forma calorosa mas nem sempre efusiva, ao vivo todas as canções sofrem um tratamento dançável — claramente desenhado para incentivar o público a mexer-se. Mesmo canções que em Volcano têm uma aura mais relaxada, como “I’ve Been in Love” ou “Back On 74”, puxam pelos galões do funk e abusam do baixo em concerto, até porque Josh Lloyd e Tom McFarland — o duo que começou tudo isto — sabe que é assim que têm vindo a conquistar mais e mais fãs. Ainda assim, esperemos que isso não signifique que nunca mais ouçamos canções como “Lemonade Lake” ou “Drops” em concerto.
Depois das expectativas altas deixadas pelo primeiro álbum, a banda tentou encontrar novas formas de criar, como no ligeiramente inconsistente For Ever e no expansivo Loving in Stereo. Ao chamar mais pessoas para a sua música, como neste Volcano (em que muitas das canções são encabeçadas por Lydia Kitto, membro da banda), o foco passou a ser mais o ambiente geral da canção e menos a mensagem. Essencialmente, a banda está na sua fase festeira. Isso nota-se particularmente mais perto do final, em que “Coming Back”, “Don’t Play” e “Holding On” aumentam os BPMs, com as batidas a aterrar como punhos num saco de boxe. Nem a geralmente sofrível acústica do Campo Pequeno lhes retira poder, acariciando os nossos tímpanos ao mesmo tempo que se espalham pelo nosso corpo como impulsos eléctricos.
Mas, como é claro, não houve só Volcano neste concerto. Mesmo sendo este um concerto a solo, a escolha das canções “clássicas” foi relativamente económica. Do primeiro álbum, por mais que fosse difícil escolher, as mais óbvias foram tocadas: a inconfundivelmente quente “The Heat”, “Time” e, a fechar o concerto, “Busy Earnin’”. De For Ever, seria impossível não incluir “Beat 54 (All Good Now)”, “Happy Man” ou a mais reconhecida “Casio”, mas ficámos particularmente satisfeitos pela inclusão da fabulosa “Heavy, California”. De Loving in Stereo, ouviu-se “Fire”, What D’You Know About Me”, “All of the Time” e “Keep Moving”, que continua a ter o mesmo impacto de quando foi lançada em 2021. Juntamente com “Busy Earnin’”, foram o gancho direito e esquerdo do encore que nos arrebatou.
Apesar dos diferentes géneros e abordagens que permeiam todos os álbuns dos Jungle, há um fio condutor que permite que todas as canções vão encaixando umas nas outras no alinhamento. Isso também se deve ao entusiasmo contagiante de toda a banda, que se vai movendo em palco e interagindo bastante com o público. Entre banda e público trocam-se sentidos agradecimentos e ensurdecedoras ovações, prova de mais um bem-sucedido concerto dos Jungle em Portugal.