Leonel Vieira filmou um drama no Rio de Janeiro com travo português

por Lusa,    26 Novembro, 2023
Leonel Vieira filmou um drama no Rio de Janeiro com travo português
“O último animal”, filme de Leonel Vieira
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O realizador Leonel Vieira estreia na quinta-feira uma ficção ambientada no Rio de Janeiro, sobre jogos de poder e corrupção, protagonizada por Joaquim de Almeida, e prepara-se para voltar ao universo “O pátio das cantigas”.

“O último animal”, com coprodução luso-brasileira, é um ‘thriller’ dramático rodado em 2019 no Rio de Janeiro e entrelaça linhas narrativas de várias personagens que se encontram numa só história de corrupção, tráfico de droga e lavagem de dinheiro inspirada no Jogo do Bicho.

“O último animal”, filme de Leonel Vieira

Este jogo de apostas, criado em 1892 no Rio de Janeiro, é uma espécie de lotaria que ainda é considerada ilegal, e que inclui a figura do ‘bicheiro’, que financia o jogo e que é muitas vezes conotado com atividades ilícitas.

Há 12 anos, eu leio um artigo num jornal no Rio de Janeiro sobre o Jogo do Bicho, e eu não sabia da sua existência. Aquilo é basicamente a camorra italiana, o mesmo funcionamento, mas à portuguesa. (…) O maior jogo clandestino de todo o continente americano. Eu acho aquilo fascinante e não sabia. E percebi o que tinha de curioso e transversal na sociedade”, afirmou o realizador Leonel Vieira, em entrevista à agência Lusa.

Na história do Jogo do Bicho, entre os ‘bicheiros’ contavam-se portugueses emigrados no Brasil, o que inspirou Leonel Vieira para uma das personagens de “O último animal”, o empresário Casimiro Alves (Joaquim de Almeida), que manobra uma rede criminosa de lavagem de dinheiro proveniente de tráfico de droga e envolvimento com donos de favelas.

“O último animal”, filme de Leonel Vieira

Queria uma história de cinco personagens; uma bailarina de escola de samba, um ‘bicheiro’, um ‘gringo’, um estrangeiro – que era o meu olhar –, queria um miúdo de favela e um chefe de morro”, elencou Leonel Vieira, admitindo que todas as personagens são baseadas em histórias reais.

À agência Lusa, Joaquim de Almeida explicou que participou na construção da personagem ainda durante a escrita do guião e que se inspirou em Castor de Andrade, um dos ‘bicheiros’ daquele jogo de apostas, que tinha origem portuguesa.

Uma parte que eu gostava muito [no argumento] é o facto de que podes tirar o homem da favela, mas é muito difícil tirar a favela do homem. E neste caso, o mais interessante é um homem que quer sair da favela e a sociedade não deixa”, disse o ator sobre uma das personagens do filme.

“O último animal”, filme de Leonel Vieira

Apesar de trabalhar há mais de uma década com brasileiros, Leonel Vieira admitiu que a procura de financiamento foi “um calvário” no Brasil, porque sentiu resistência das produtoras precisamente por ser um português a olhar para uma realidade que não é a sua.

Os brasileiros têm dificuldade em aceitar que um português venha fazer um filme sobre a parte negra do Brasil, se bem que envolve portugueses”, disse Joaquim de Almeida.

Leonel Vieira acrescentou: “Mostrei o filme a três ativistas negros, de favela, dos mais conhecidos do Rio de Janeiro, amigos do [ator] Júnior Vieira. Era fundamental mostrar a alguém que entende isto, alguém muito implicado na causa. E quando eles viram o filme, disseram que adoraram e que era muito verdadeiro e imparcial”.

“O último animal” chega aos cinemas, quando o realizador acaba de filmar uma minissérie sobre o empresário Rui Nabeiro e se prepara para voltar ao universo da comédia “O pátio das cantigas” (2015), que se mantém o filme português mais visto de sempre, desde que há estatísticas sistematizadas, com mais de 608 mil espectadores.

Questionado sobre a possibilidade de o cinema português ter atualmente espectadores que não são oficialmente contabilizados, por serem exibidos noutros ecrãs além da sala de cinema, Leonel Vieira alertou que a rendibilidade ainda está no circuito comercial.

Eu não tenho uma preocupação que os meus filmes sejam vistos, isso já tenho há anos em Portugal. O que eu não acho bem é quando não nos pagam decentemente. E muitos ainda não são pagos decentemente [fora do circuito comercial]. As salas ainda são o lugar onde o êxito é diretamente proporcional à rentabilidade”, disse.

Para Leonel Vieira, o mercado precisa de “um equilíbrio de forças e de dinheiro” perante uma lógica de exibição que mudou.

O que vai acontecer com o cinema é que vai continuar e vai ser uma das janelas [de exibição], mas não vai ser a principal. A principal claramente veio para ficar, que é o ‘streaming’”, disse.

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