‘Lotus’, a (re)afirmação musical de Soen
Se existe um país no mundo capaz de produzir bandas de metal com uma qualidade acima do normal de forma constante, esse país é escandinavo e dá-se pelo nome de Suécia. A verdade é que a música pesada nórdica (e mais concretamente sueca) é possivelmente a mais refrescante, inovadora e edgy da Europa. E tem em Soen um dos mais recentes e brilhantes exemplos.
Soen foi formado em 2010 na bateria por Martin Lopez (Ex-Opeth e Ex-Amon Amarth), Steve Di Giorgio (Testament, Sadus & Ex-Death) no baixo, Joel Ekelöf como vocalista e Kim Platbarzdis na guitarra, tendo lançado em 2012 o seu primeiro álbum Cognitive. Este teve uma receção muito positiva na crítica, tendo sido, no entanto, muito comparado em termos musicais, a Tool.
Do primeiro álbum verificamos hoje em dia que apenas Martin Lopez e Joel Ekelöf se mantiveram e que musicalmente a banda evoluiu de uma forma tremenda. Os riffs intrigantes e aura “melancólica” que as suas músicas despertam contrastam de forma brilhante com a voz barítona de Joel, combinação essa que culminou em 2017 o com maravilhoso Lykaia. Este álbum foi um autêntico marco musical no panorama do metal progressivo, em que a banda mostra toda a sua qualidade e distanciam-se por completo de uma comparação agora injusta. Soen é Soen. E Lotus é uma (re)afirmação.
Lançado a 1 de fevereiro deste ano Lotus é o quinto álbum dos suecos que além de Martin e Joel, já são há alguns anos compostos por Lars Åhlund e Stefan Stenberg nas teclas e baixo, bem como Cody Ford na guitarra. Este é mesmo um dos mais recentes elementos do grupo, tendo-se juntado à banda apenas no final do ano passado, com a curiosidade de ser o único elemento não sueco do grupo, uma vez que nasceu no Canadá.
Musicalmente Lotus pega onde Lykaia acabou. Riffs intrigantes e passagens inteligentes contrastadas com a voz hipnótica de Joel. O virtuosismo é notório e a nossa satisfação aumenta quando nos apercebemos que, apesar da complexidade das suas composições, todos os momentos das músicas são ponderados de modo a tornar a música… boa. Não existe exagero nos solos, não existe nenhuma arrogância nos riffs. Existe um conjunto de ótimos músicos que pretendem fazer música boa. Lotus diferencia-se do seu antecessor com maior preponderância de músicas mais “calmas” e uma utilização mais notória das teclas nas suas composições. Se em Lykaia tivemos Lucidity como um genial contrapeso ao metal progressivo, em Lotus encontramos a música homónima bem como River. É possível também perceber ao longo do álbum que maior parte das músicas têm uma maior dinâmica e transições entre o metal e rock progressivo, provavelmente inspirados pelos largos anos que Martin Lopez esteve em Opeth. No entanto, mais uma vez, é aí que a comparação acaba. Soen é Soen.
Lotus é o álbum em que obtemos a confirmação de que Soen se tornou uma banda completamente riff driven, que, apesar de serem escritos em 4/4, a sua duração e esquizofrenia tornou-se inconfundível. É também um álbum detentor de linhas baixo irreverentes, refrões cativantes e breakdowns cada vez mais heavy – sem nunca se tornarem enjoativos e repetitivos. Em Lotus encontramos um álbum cheio de dinâmicas com momentos de alto ritmo e guitarras poderosas, bem como simplesmente teclas e voz a tomarem o protagonismo. Já na bateria fica também confirmado (como se tal ainda fosse necessário) o quanto Martin Lopez enriquece musicalmente uma banda. Capaz integrar ritmos de ascendência latina em contextos agressivos, característica mais que dominante também nos seus muitos anos em Opeth, é com Martin que a palavra dinâmica ganha forma e contexto.
Highlights do álbum: “Lascivious”, “Martyrs”, “Lotus” e “Covenant”, com “Opponent” e “Penance” imediatamente atrás.
O grande feito desta banda – Lykaia – torna-se, no entanto, uma espécie de maldição, visto que sentimos a necessidade de comparar Lotus com ele. É que apesar muito bom, sentimos que a parte final do álbum não é tão forte e consistente como o seu antecessor. Se para muitas bandas ter 6 de 9 músicas fantásticas é algo impressionante, ao nos apercebermos que em Lykaia todas as 8 o eram, sentimo-nos no dever de não colocar ambos os trabalhos no mesmo saco. E que sendo um álbum diferente, apesar de coerente à musicalidade da banda, Lykaia merece continuar a ser o reconhecimento máximo da ainda curta, mas maravilhosa, discografia dos suecos.
De referir também que a tour de promoção a este álbum passará por Portugal nos dias 30 e 31 de março, no Hard Club (Porto) e RCA (Lisboa), respetivamente.
Crítica de Pedro Piedade