O aniversário da composição musical de Rodrigo Leão preencheu o Coliseu do Porto
Em semana de celebrações dos vinte e cinco anos de carreira a solo, Rodrigo Leão visitou o Coliseu do Porto nos dias 7 e 8 de novembro, seguindo para Lisboa para completar as festividades. Por cá, deixou um testemunho de toda a sua amplitude musical, que preencheu a noite de frio cerrado do Porto. Uma viagem pela sua história desde 1993, ano em que lança, pela primeira vez, o seu trabalho a solo. “Ave Mundi Luminari” não foi esquecido nesta comemoração robusta em música variada e intensa.
Antes de se contar com a sua ilustre presença, o Coliseu recebeu Francisco Sales, guitarrista da banda inglesa Incognito, que, ao abrigo da promotra Uguru, mostrou alguns dos seus dotes e do trabalho “Miles Away”, álbum lançado este ano. Foi uma preparação suave, subtil, paulatina, com ritmos de jazz e de progressividade musical que marcou um rosto humilde e simples, que quis contar a paz através da sua guitarra para um Coliseu onde se sentiu engrandecido. E assim o fez, desvelando um caminho de tranquilidade e de quietude em acordes que deixaram o público contagiado e silenciado, preparado para umas solenes bodas de prata.
No entanto, Rodrigo Leão quis entrar com toda a eletricidade e fê-lo com o recurso a . As luzes e a intensidade sonora acompanharam toda uma experiência que se quis prendar mais do que ser prendada, sendo que os convidados para a cerimónia entregaram o seu interesse e a sua devoção à plenitude que o músico português trouxe para o palco. Ana Vieira deu voz a alguns dos temas mais célebres de Rodrigo Leão, entre “Vida Tão Estranha” e “Pasión”. Antes de Selma Uamasse chegar e cantar “Rosa” e a célebre “O Pastor”, que os Madredeus tão bem souberam imortalizar, o grupo colocou o público anestesiado com algumas das suas sonoridades mais tranquilas, como “Empty Room”, “Histórias” e a imensa “Alma Mater”.
Ângela Silva devolveu-nos os primeiros tempos de Rodrigo Leão a solo, em que se dedicava à música sintonizada com as tradições da música de câmara, em que o latim ordenava a sua expresssão musical (“Ave Mundi Luminar” foi lançado em 1993, há 25 anos). A ela, chegou a juntar-se Selma, numa sublime interpretação de “Carpe Diem” e de “Ave Mundi”, que se destacam no repertório inaugural de Leão, redescoberto por este soprano de Ângela. Selma também se aliou a Ana Vieira em alguns outros temas, como “Ave Mundi” e “Ya Skaju Tebe”. Mesmo assim, foi Ana Vieira que, antes e depois da típica ovação, foi perdurando, cantando “Lonely Carousel”, “No Sè Nada”, “Voltar” e uma homenagem aos malogrados Francisco Ribeiro (ex-Madredeus) e Ricardo Camacho (ex-Sétima Legião) em “Ascensão”.
O violino resoou com mestria e magia (que destreza a de Viviena Tupikova), num jogo de cordas que assentou com a viola de arco, de Bruno Silva, e com o violoncelo, em Carlos Gomes. O baixo, com João Eleutério, e a bateria, de Frederico Gracias, conjugaram na perfeição num impacto mais direto, sem o prolongamento discursivo dessas cordas, e alinharam-se na coordenação do trombone, do metalofone (encarregues por Marco Alves) e do acordeão de Celina da Piedade. Os sintetizadores e o piano fluíram em todo este jogo onde as vozes colocavam a cereja no topo do bolo das bodas de uma carreira de luxo, repleta de projetos ímpares e coletivos, que não foram esquecidos na celebração.
Rodrigo Leão foi, desta forma, homenageado condignamente numa passagem cronológica pelo seu percurso musical, sem esquecer as suas origens grupais. Por entre as harmonias ressonantes e dissonantes, sente-se uma pluralidade que chega a conceber o pleno da música num aniversário que teve de tudo. Tudo começou com energia e vigor, para passar para a toada suave e discursiva que fez antecipar a melancolia e o sossego. Os vocais ajudaram a reequilibrar as forças, por entre o requinte do latim, o charme do francês e o atrevimento do espanhol. O português foi o elo de ligação, que liga maior parte das suas raízes, embora o seu mundo seja um outro, que não está ao alcance de tantos assim, mas que consegue ainda unir mais: a música em digressão pelos seus mundos em composição.
Na cobertura do concerto não foi possível a captação de imagem.