Panda Bear fiel a si mesmo em ‘A Day With The Homies’
Já se passaram quase 11 anos desde que Noah Lennox (operando sob o nome artístico de Panda Bear) lançou Person Pitch, aquele que muitos fortemente consideram ser o seu auge criativo enquanto músico a solo. As intermináveis e aliciantes ondas de som presentes nesse disco, criadas a partir de uma diversidade imensa de samples e loops, permitiam-no construir uma das suas mais ambiciosas e interessantes viagens pelo pop experimental – sem desconsiderar o que até então também já tinha feito com os igualmente ecléticos Animal Collective –, enaltecida pela sua bela capacidade de escrever melodias extremamente contagiantes. Músicas como as épicas “Bros” e “Good Girl / Carrots” ou as aquosas “Take Pills” e “Comfy In Nautica” pareciam o casamento perfeito entre o fascínio de Lennox por Brian Wilson e a sua própria apurada sensibilidade, fazendo do álbum gravado em Lisboa um marco importante na carreira do artista.
Desde então, no entanto, poder-se-á dizer que Lennox tem vindo a correr ligeiramente menores riscos, introduzindo um certo grau de acessibilidade ao seu processo de escrita. Tomboy, de 2011, demonstrou isto mesmo com clareza. Por outro lado, o seu sucessor Panda Bear Meets The Grim Reaper parecia quase enigmático no seu título: exceptuando momentos mais introspectivos e desoladores tais como aqueles encontrados em “Tropic Of Cancer”, “Come To Your Senses” ou “Lonely Wanderer”, a sonoridade do disco aparentava ser mais vívida e colorida que a que pontuou trabalhos passados. Os mais cínicos poderiam especular que Lennox começava a querer pôr termo ao seu pseudónimo; ajudava a essa teoria que do álbum fizesse parte a vibrante e viciante “Mr. Noah”, assinada em nome próprio como se de uma reivindicação da sua identidade se tratasse.
Mas tais suposições não terão passado disso mesmo, e Panda Bear inicia o ano de 2018 com o lançamento do EP A Day With The Homies. Sem grandes reinvenções ou mudanças de abordagem, este transmite a ideia de que, com o tempo, Lennox fica cada vez mais confortável com o estilo singular que criou para si, e, se lhe falta algum do esplendor dos seus melhores dias, também está longe de se tornar estagnado ou de se render à redundância.
De certa forma, as cinco músicas deste projecto representam uma espécie de progressão temática do seu último álbum. Os ritmos sincopados de palmas e baixos com que a faixa de abertura “Flight” se dá a conhecer criam a paleta ideal para Lennox exercitar as suas harmonias cheias de expressividade, e não seria estranha a sua presença nas secções mais alegres de Panda Bear Meets The Grim Reaper. Por outro lado, os acordes de guitarra fragmentados e os golpes de sintetizadores cheios de reverberação de “Shepard Tone” lembram algo que os britânicos Underworld poderiam ter feito no clássico Dubnobasswithmyheadman ou que pudesse ter sido usado pelos The Orb.
Estas experimentações de Panda Bear com a música electrónica são, de resto, desde sempre uma parte integral das suas composições, e é tanto dela como do também preponderante neo-psicadelismo que bebe “Part Of The Math”, porventura o mais bem conseguido tema do EP. No seu segmento final, a repetição do verso “open your eyes” acompanhada do vertiginoso ruído opera como um chamamento, um convite por parte de Lennox feito aos seus ouvintes para que estes verdadeiramente mergulhem nas múltiplas camadas texturadas de A Day With The Homies. Isto é um objectivo que consegue concretizar, não fosse essa uma das suas mais reconhecidas habilidades. Depois de um ano em que os Animal Collective desiludiram ligeiramente com The Painters, Panda Bear mostra que, apesar das inevitáveis lacunas com que o seu mais recente esforço sofre, a sua criatividade e a sua irreverência não se esgotaram.