‘The Third Murder’: a lei e a realidade não podem ser desumanamente simplificadas

por João Pinho,    6 Maio, 2018
‘The Third Murder’: a lei e a realidade não podem ser desumanamente simplificadas
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A lei não deve ser criada ou aplicada sem um lado humano. Nem o juiz nem o legislador são robôs e convém que não o sejam. Para o bem e para o mal, será que é importante distinguirmos crimes com base no contexto ou nas intenções? Por outras palavras, um homicídio por questões de dinheiro é menos grave que um homicídio por vingança? Claro que isto dá uma maior liberdade, mas também maior responsabilidade ao poder político e judicial. E é disso que o filme japonês “The Third Murder” retrata.

Numa sociedade laica onde não existe nenhum ser omnipresente e todo-poderoso, será que faz sentido existir alguém que tenha o direito de decidir o futuro de uma pessoa e, em alguns casos, se ela merece ou tem o direito à vida? Esta discussão filosófica tem importância, porque é esse o papel que um juiz tem da perspectiva da pessoa cujo destino está a ser julgado. Por outras palavras, é o valor humano que está em causa. Será que há pessoas que merecem morrer pelo seu passado ou presente, será que há pessoas cujo direito à vida depende do contexto onde nasceram? Não é fácil dar resposta a estas perguntas, principalmente em casos tão pragmáticos como os que o filme apresenta.

O realizador japonês Hirokazu Kore-eda já está muito habituado a debater e explorar estas temáticas muito humanas e actuais. Já em 2013, realizou um filme sobre os limites morais em que dois casais trocam os seus filhos, após descobrirem que à nascença tinham sido trocados no hospital. E fá-lo sempre de uma forma genial. Através do quotidiano de cada personagem, observamos como o enredo se desenrola. O espectador é um mero observador que não consegue logo de imediato julgar as personagens e as situações, mesmo estando de fora. Na realidade, o espectador acaba por duvidar de si próprio e do que faria em tais situações.

Nesta história, um jovem advogado acaba por tentar defender um senhor que estava acusado de matar o seu chefe. Mas com o passar dos dias tanto ele como o público vão-se apercebendo que a culpabilidade dos actos não pode ser concluída tão facilmente. O acusado mostra-se contraditório e desde o início parece estar a esconder algo. No fim, questionamo-nos até que pode um crime pode ser contextualizado e, por isso, uma sentença atenuada.

Assim, surgem várias questões. Será que há crimes justificáveis? Será que matar uma pessoa porque a última violenta sexualmente a sua própria filha é justificável? Não é uma história sobre o vigilante que age fora da lei. Esta é uma discussão de um cidadão comum, cuja história não é assim tão fácil de explicar e que é um retrato dos sentimentos mais básicos do ser humano, a violência, o medo, a tristeza ou a revolta. A lei e a realidade chocam constantemente, porque, no final de contas, todas estas questões tratam de seres humanos e nada pode ser desumanamente simplificado.

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