Um breve guia para comprar uma bicicleta eléctrica
Uma bicicleta eléctrica é, posto de forma simples, uma bicicleta convencional, mas com um motor. E uma bateria. E uma série de cabos que as outras não têm. É também um meio de transporte diferente, menos exigente para o ciclista, mas muito mais exigente para o material. Uma bicicleta eléctrica acaba por ter praticamente a mesma funcionalidade de uma bicicleta convencional, mas com ganhos significativos no tipo de esforço necessário para vencer obstáculos como as subidas mais íngremes ou os ventos frontais, algo importante em percursos mais longos ou em zonas mais complicadas de cidades como o Porto ou Lisboa.
A maioria das bicicletas eléctricas, basicamente todas aquelas que podem ser chamadas de “bicicleta” e cujo enquadramento no código da estrada é semelhante ao das bicicletas convencionais, são “pedelecs”. Ou seja, não tem acelerador e a assistência é activada pelo sensor colocado no eixo pedaleiro, considerando o esforço da pedalada a cada momento.
Depois destes anos todos em cima de uma bicicleta, entre os quais muitos a vendê-las a quem as usa para as suas deslocações diárias, continuamos a afirmar que a maioria das pessoas que faz percursos até sete ou oito quilómetros para cada lado não precisa de uma eléctrica. Andar de bicicleta implica pedalar, algum esforço faz parte. Claro que há muitas excepções, que podem ir da forma física do ciclista, ao relevo particularmente acidentado do trajecto ou à carga que se tem que carregar e é para estas que gostamos de olhar quando recomendamos uma bicicleta eléctrica.
O que escrevemos para trás pode levar-te a pensar que numa eléctrica não nos exercitamos, mas isso não é bem assim. Uma bicicleta eléctrica é, de facto, uma solução excelente para quem, não querendo abdicar de algum esforço, quer ganhar alguns minutos num percurso ou vencer as subidas mais complicadas, aliás, como o Lau demonstrou neste postal há pouco tempo publicado na Gazeta.
Num percurso muito curto, claro que o esforço é menor ou quase inexistente, mas num percurso mais longo, a forma física do ciclista continua a ser um factor importante, porque a bicicleta só anda enquanto a pedalarmos. Um factor que também conta para este esforço, é o limite de velocidade de 25 km/h, no fim do qual o motor desliga e é o ciclista que carrega tudo. Este limite é muito curto e isso nota-se nos percursos suficientemente longos para “embalar”. Aqui sobressaem os inconvenientes das e-bikes, que são o peso e a maior fricção, especialmente nos modelos com motor central.
As bicicletas eléctricas são também uma solução excelente para quem pedala carregado, seja com crianças, com bagagem ou com ambos. É curioso o padrão que vemos na loja com a venda de cargo-bikes. Tudo que vai para a zona de Aveiro é sem motor, quase tudo o que é vendido no Porto é eléctrico.
As situações em que mais costumamos recomendar as eléctricas são aquelas em que a única alternativa é o automóvel, como as deslocações mais longas. Muitos clientes pedalam mais do que quinze quilómetros para cada lado e em trajetos com trânsito, em que, de facto, estão mais seguros quando vão mais rápido e em fluxo com os restantes transportes, especialmente nas subidas, que, em percursos suburbanos, podem ser bastante longas. Os motores recentes apresentam níveis de assistência distintos, dependendo da potência, mas têm em comum melhores prestações no arranque e na abordagem a subidas mais íngremes. Os “sensores de torque” permitem contudo uma progressividade e suavidade proporcional ao esforço feito a pedalar, o que abona a favor da segurança da bicicleta.
É por isso que, antes de gastares todo o dinheiro que custa uma boa bicicleta eléctrica, convém ponderar se vais mesmo precisar dela. É mais pesada e menos prática para armazenar ou carregar e as baterias têm um tempo de vida longo, mas ainda assim limitado. Também dói mais deixá-la amarrada a um poste o dia todo à mercê da gandulagem e da intempérie. Muitos dos percursos mais longos acabam por ser feitos mais facilmente de forma intermodal, conjugando uma dobrável compacta como a Brompton com os transportes públicos, por exemplo.
Por outro lado, se não te vês a pedalar sem ajuda, uma eléctrica é uma solução excelente. Sim, as baterias têm um tempo de vida limitado, mas hoje em dia conseguem-se autonomias grandes, superiores a 100 quilómetros e tempos de vida prolongados, podendo uma bateria vulgar durar vários anos. A generalidade das baterias comercializadas nos dias de hoje são de lítio e, para além de uma vida mais longa, permitem autonomias completamente diferentes daquelas conseguidas pelas baterias mais antigas.
Um bom motor é também um bom investimento, sendo possivelmente o componente mais durável de toda a bicicleta e é aqui que começa uma espécie de “negociação” com os nossos clientes. Os motores das bicicletas eléctricas podem ser centrais (no eixo pedaleiro) ou no cubo (eixo da roda da frente ou traseira).
A fiabilidade, uma melhor adaptação ao ritmo imposto pelo ciclista devido aos sensores de torque (em vez do sensor de movimento, que tem uma resposta mais brusca) e uma melhor ciclística estão entre as vantagens dos motores centrais, que são normalmente mais caros e exigem o desenvolvimento de quadros específicos para os acomodar. Os motores no cubo equipam normalmente os modelos mais económicos e são aqueles que são vendidos em kits para instalação em bicicletas convencionais.
Apesar de vendermos modelos com ambos os tipos de motor, a verdade é que muitas marcas estão a fazer o upgrade dos seus modelos mais básicos com motor no cubo para versões um pouco mais económicas de motores centrais, como o Shimano Steps E5000. A belga Achielle foi uma das marcas que deu este salto, tendo agora os seus modelos de entrada um pouco mais caros, mas com uma qualidade muito superior aos seus antecessores.
Para beneficiar destas vantagens, da durabilidade, da fiabilidade, da tecnologia, é preciso investir, porque o que é bom, normalmente não é barato. Isto também se aplica à própria bicicleta que está na base da e-bike, que não tem que ser só tão boa como o é uma boa bicicleta para utilização diária. Tem que ser ainda melhor, porque tem que aguentar um peso maior, ser reforçada nos sítios correctos e suportar um esforço muito maior porque há muito mais energia a ser libertada. Se juntarmos a isto uma quilometragem muitas vezes bastante superior ao normal, é fácil perceber para onde vai o dinheiro. Não montarias o motor de um Land Rover num papa reformas, pois não?
Resumindo, há muita gente que questiona os valores pedidos por uma e-bike, mas a verdade é que para esta ser boa, tem que ter um motor bom, o que tem um preço, e como base uma bicicleta boa, que também tem um preço.
Montar um “kit” de fabrico duvidoso de 600 euros numa bicicleta de 200, com a mão de obra, vamos ter uma bicicleta eléctrica de pelo menos 900 euros, o que é um preço alto para, basicamente, um charuto que não vai dar conta do recado. Depois é só somar os custos de manutenção, que vão inevitavelmente ser altos.
Tipos de e-bikes que nos interessam
Não nos interpretes mal. Todas as e-bikes nos interessam, desde que sejam boas e feitas para durar. Contudo, há aquelas que nos interessam mais e são as que estão vocacionadas para a mobilidade e uma utilização urbana.
A generalidade das bicicletas eléctricas urbanas caem na tipologia “híbrida”, sendo indicadas tanto para o dia-a-dia, como para passeios mais longos. Posições de conforto, mais verticais, mas reguláveis, permitindo uma condução mais desportiva na longa distância, guarda-lamas, porta cargas e baterias com muita autonomia. São características comuns a quase tudo o que vendemos, incluindo a generalidade dos modelos da Kalkhoff.
Há contudo alguns modelos mais urbanos e que também nos têm despertado interesse, quanto mais não seja pelo preço mais competitivo sem prejudicar a qualidade. A Kalkhoff tem alguns nesta categoria, como o Berleen, de roda 28’’, com um design perfeito e um aspecto muito minimalista para uma eléctrica. O segredo? Motor (no cubo traseiro) e bateria mais pequenos que o normal, prejudicando a potência, autonomia e um pouco da ciclística, mas simplificando a estética, a utilização e o preço (2250€ na versão 5G Move).
Ainda dentro dos modelos mais urbanos, existem no mercado diversas opções dobráveis e compactas. Enquanto a Brompton não liberta o seu modelo eléctrico no nosso mercado, adoramos a opção de roda 20’’ da Kalkhoff, a Sahel 3, com grande autonomia (até 200 km) e um preço a começar nos 2400 euros.
Agora, aquilo que gostamos mesmo: as cargo-bike eléctricas. Nestas, a questão do preço é realmente determinante e limitadora para grande parte dos nossos clientes, mas, havendo possibilidade, é um investimento fantástico. Existem diversas opções, tanto com roda em linha como triciclos, mas, considerando a realidade do trânsito do Porto, tendemos a preferir os modelos com duas rodas em linha, mais ágeis e compactos. Apesar do volume de carga maior, não há grande diferença na tecnologia utilizada, sendo praticamente a mesma das bicicletas eléctricas “simples”. Uma bicicleta de carga eléctrica de sonho? Esta Bakfiets equipada com um motor central Shimano Steps e transmissão Alfine Di2, que podes conhecer melhor aqui.
Este texto foi publicado originalmente no Velo Culture, tendo sido aqui reproduzido com a devida autorização.