Danilo Thomaz: “Os governos de Lula e Dilma não fizeram absolutamente nada pelos gays”
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A duas semanas do segundo turno das eleições gerais brasileiras, Jair Bolsonaro continua na frente. A mais recente pesquisa eleitoral, publicada pelo IBOPE, ontem, dia 16, revela que o candidato do Partido Social Liberal tem 59% das intenções de voto e Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT), tem 41%. Esta é percentagem em votos válidos.
Segundo a Globo, que divulga a sondagem, “para calcular os votos válidos, são excluídos da amostra os votos brancos, os nulos e os eleitores que se declaram indecisos. O procedimento é o mesmo utilizado pela Justiça Eleitoral para divulgar o resultado oficial da eleição. Para vencer no 2.º turno, um candidato precisa de 50% dos votos válidos mais um voto”. Os valores, em votos totais, dão 52% a Bolsonaro e 37% a Haddad.
Bolsonaro continua a crescer desde o 1º turno, quando teve 46% e, com ele, cresce a violência no Brasil. Durante a campanha eleitoral, os ataques violentos com motivações políticas têm-se multiplicado. Uma das vítimas foi o mestre de capoeira Romualdo Rosário da Costa, de 63 anos, conhecido como Moa do Katendê, assassinado na madrugada seguinte às eleições, com 12 facadas, em Salvador, na Bahia, depois de uma discussão política em que afirmou ter votado no PT. O autor do crime foi já detido.
Nessa mesma noite, uma jovem de 19 anos foi esfaqueada em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, por vestir uma camisola onde estava escrito #ELENÃO e usar uma mochila com um autocolante LGBTI+. Os atacantes desenharam um símbolo semelhante a uma suástica (o desenho estava ao contrário) na sua barriga.
A Agência Pública, em parceria com a Open Knowledge Brasil, investigou dezenas de ataques ocorridos desde o dia 30 de setembro, até 10 de outubro (quando foi publicada a peça), e concluiu que a contagem vai em pelo menos 70, sendo que 50 destes foram feitos por assumidos apoiantes do candidato do PSL, seis contra apoiantes de Bolsonaro, e 15 agressões registadas não conseguiram atribuir-se a nenhum dos campos políticos em disputa.
Mas não ficou por aí: no dia anterior à nossa conversa com Danilo Thomaz, jornalista e coordenador de comunicação da Flip – Festa Literária Internacional de Paraty, foi assassinado a tiro um líder do Movimento Sem Terra, Aluísio Sampaio, no Pará. Danilo Thomaz tem acompanhado a onda de ataques no Brasil desde o início da campanha, em especial os dirigidos à comunidade LGBTI+, incluindo os cânticos proferidos pela claque do Palmeiras, este mês, numa estação de metro, em São Paulo. Dezenas de fãs gritavam: “Oh bicharada, toma cuidado, o Bolsonaro vai matar viado”.
Um dos instigadores da onda de violência contra a população LGBTI+ é Jair Bolsonaro, o candidato que se diz homofóbico “com muito orgulho”. Em entrevista à TV Camara, em Novembro de 2010, disse: “O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro e ele muda o comportamento dele”. E no ano seguinte, em entrevista à revista Playboy, afirmou que “seria incapaz de amar um filho homossexual”: “Não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo”.
Bolsonaro escreveu na sua conta de Twitter, no dia 10 de Outubro: “Dispensamos voto e qualquer aproximação de quem pratica violência contra eleitores que não votam em mim”. Mas “quem quiser acreditar, acredite”, desconfia Danilo Thomaz. O jornalista diz: “Você não tem 49 milhões de fascistas no Brasil”, mas “ainda nenhum apoiador de Bolsonaro condenou os atos de violência”.
Apesar da candidatura do líder nas pesquisas eleitorais incitar e praticar o ódio, o Partido dos Trabalhadores, de Dilma Rousseff e Lula da Silva, não está isento de culpas: “Essa onda conservadora foi gestada pelo PT de diversas maneiras”. Na opinião do coordenador de comunicação da FLIP, “os governos petistas, tanto o do Lula, como o da Dilma, não fizeram absolutamente nada pelos gays”. Por outro lado, quando os petistas estavam “no auge do sucesso”, “chamavam qualquer pessoa que discordasse deles de fascista. Quando o fascista chegou, eles não têm muito mais o que falar”.
Nesta entrevista, abordamos os erros do PT durante os últimos governos, a ameaça autoritária de Jair Bolsonaro, a violência durante a campanha, o legado de Fernando Haddad enquanto Ministro da Educação e Prefeito de São Paulo e a homofobia e transfobia no Brasil.
Texto: Ricardo Esteves Ribeiro
Preparação: Maria Almeida, Pedro Miguel Santos, Ricardo Esteves Ribeiro e Tomás Pereira
Som: Bernardo Afonso e Ricardo Esteves Ribeiro
Imagem de destaque: Ben Tavener, Curitiba, Brasil (São Paulo LGBT Pride Parade 2014)