Dino D’Santiago e MARO em perfeita simbiose no Ageas Cool Jazz
Na última sexta-feira, dia 19 de Julho, o Parque Marechal Carmona, em Cascais, encheu para mais um dia de Ageas Cool Jazz. Desta feita, uma noite dedicada à música feita por portugueses e por falantes da língua portuguesa.
Ao cair da tarde, o público que chegava era recebido pelo Rogério Pitomba Trio, que ocupava o palco Cascais Jazz Sessions by Smooth. Ainda que o trio, vencedor do Concurso Talentos Ageas CoolJazz by Smooth FM, possa ser ainda desconhecido, o baterista Rogério Pitomba está longe de ser um novato nestas odes. Nascido em Rio Grande do Sul, Brasil, Rogério Pitomba já passou pelos palcos de alguns dos mais ilustres festivais de jazz. Neste cair de tarde, remata o set com apenas bateria, perante a admiração dos seus companheiros de palco e do público, mostrou-nos mais uma vez que o jazz feito em Portugal está de boa saúde.
Já a lua quase cheia brilhava no horizonte quando MARO subiu ao palco. Não sendo especialmente novata nos palcos do Cool Jazz (em 2019, abriu para Jessie J, em 2020 cantou com Jacob Collier), MARO prometeu começar tranquila e terminar “inquieta”, mantendo-se em todas as circunstâncias assoberbada pelo carinho que ia recebendo do público. A jogar em casa, MARO presenteou-nos com temas dos seus discos “can you see me” e “hortelã”, e com temas que tem vindo a desenvolver. No primeiro tema “oxalá”, a manifestação de interesses foi lançada nas palavras “oxalá dê certo e queiras ficar”, seguindo-se “tens morada em mim”, que serve de metáfora para a sua relação com o festival e com o espaço, onde MARO reconhece a importância do Cool Jazz na sua vida, como se “fosse uma casa sem tecto” onde a artista reside. Passamos por “ouvi dizer”, passamos para uma versão despida de “lifeline” (cuja versão original tem, segundo a artista mais “untz, untz”, sinal das novas sonoridades que tem vindo a explorar) e, em “há-de sarar”, MARO confessa que o seu sonho de um projecto de 3 guitarras se havia realizado, e ali, em palco, o seu sonho estava à frente de todos. Acompanhada por Pau Figueres e Darío Barroso, MARO calcorreou os temas da sua vida, passou ao de leve por “The Scientist” dos Coldplay e terminou com “saudade, saudade”, tema quase cantado em uníssono. O formato acústico não foi perdido num espaço de tão grande dimensão, repleto de carinho entre público e artista, num namoro que facilmente ficava até à madrugada.
Depois de MARO, foi a vez de Dino D’Santiago. Depois de uma digressão em que subia “sozinho” ao palco, Dino faz-se agora acompanhar de Pri Azevedo, Emílio Lobo e Peterson Gau. Em “Esquinas” ouve-se “Aqui toda a gente é parente” e isso nota-se na comunhão das muitas pessoas que ali estão, de várias origens e línguas maternas. Entre canções, Dino diz “sintam-se em casa, só não quero é people nu”. Pelo menos que tenhamos visto, não houve, mas dançou-se como se ninguém estivesse a ver. Entre especialistas em funaná e aspirantes a dançarinos minimamente aceitáveis, o público ocupava todo o relvado do hipódromo para dançar, para saltar e celebrar e ser livre, longe de qualquer “escravatura mental”.
Há muito para falar de Dino D’Santiago. Vocal sobre as suas convicções, extremamente honesto sobre as suas emoções e apaixonado por tudo o que nos une, Dino D’Santiago não descansa nem se conforma, seja no palco seja fora dele. Com a sua associação recentemente fundada (Mundu Nôbu) e quase a reiniciar os estudos (Jazz e Música Moderna), a presença de Dino D’Santiago em palco e a sua voz parecem estar cada vez melhores. Temo-lo visto por esses palcos fora, vimo-lo na televisão, ouvimo-lo nas rádios e comprova-se que a sua ginga é eterna e a voz cada vez mais imaculada. No Ageas Cool Jazz, no qual já desempenhou o papel de espectador por mais de uma dezena de vezes, a sua presença em palco denotou, mais uma vez, a sua inquietude e a sua vontade de fincar pé num mundo que põe à prova o maior dos resilientes.
Nos concertos de Dino há sempre um momento dedicado à mulher e às muitas que marcam a sua vida. No palco do Ageas Cool Jazz, recordou-se Sara Tavares, omnipresente na sua Nova Lisboa e em toda a sua música, em “Nôs Tradison”. Momentos depois, a coragem da sua sempre eterna avó Teresa foi recordada em “Brava (Carta Pa Tereza)”, e a meio de “Como Seria” foi a vez de Luedji Luna subir ao palco, numa manobra de admiração mútua e de cumplicidade, que desembocou na apresentação de “Oh Bahia”, tema fruto da colaboração que têm vindo a desenvolver. Aproximava-se o final do concerto, sem grande sinal de cansaço entre as partes, quando MARO – a artista que Dino mais ouviu no ano passado – sobe ao palco para “Tudo certo”. Dino tem um mundo dentro dele, e faz questão de o mostrar e de fazer acompanhar – física ou metafisicamente – por quem o habita.
O concerto de Dino termina com o funaná, com o público a pedir mais e com o apelo para que o Ageas CoolJazz dure para sempre. E quando já nós achávamos que a dança iria continuar com o DJ set de Progressivu, deparamo-nos com Dino no meio do público para “Fidju Poilon”, despedindo-se depois com uma versão a capella de “Is this love” de Bob Marley. E é mesmo amor.
A noite terminou com um bailecore triunfal com o DJ set de Progressivu.
O Ageas CoolJazz continua no dia 27/07 Marina Sena e Luedji Luna, no dia 30 teremos Fat Freddy’s Drop e Expresso Transatlântico e despedimo-nos da 20.ª edição do Ageas Cool Jazz com Jamie Cullum e Inês Marques Lucas. Aos domingos até ao final do mês, estará também presente nos Jardins da Casa de Histórias Paula Rego.