Interferências, Prisma e Naturezas Visuais ocupam o MAAT
O MAAT está aberto de quarta a segunda, das 11h00 às 19h00. Aos primeiros domingos de cada mês, a entrada é gratuita.
A nova temporada do MAAT (Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia) traz-nos três novas exposições, Prisma, de Vhils, Interferências, com a curadoria de Alexandre Farto (aka Vhils), António Brito Guterres e Carla Cardoso, e Naturezas Visuais. Esta nova temporada é também a primeira com João Pinharanda na direcção do Museu, posição que ocupa desde o início do ano. Nos últimos anos, o maat tem-se assumido como um museu aberto, virado para o questionamento que vai além da exposição de obras de arte. É um espaço de reflexão e de reflexo do mundo em que vivemos. Tem sido assim e continuará a ser assim. João Pinharanda, em apresentação às três exposições que agora ocupam o edifício desenhado por Amanda Levete, reiterou-o e reafirmou a necessidade de olhar para a comunidade e trazer artistas e linguagens que não habitam tradicionalmente as paredes de um museu. O resultado é surpreendente e avassalador, não se extinguindo nem no tempo nem no espaço com a programação da exposição Interferências ao longo dos próximos 6 meses, e com a extensão da loja do museu para acomodar temporariamente serigrafias de artistas emergentes e consagrados.
A exposição Prisma de Vhils (Alexandre Farto), que marca o regresso do artista ao MAAT depois da sua primeira exposição individual em 2014, é, nas palavras de João Pinharanda, “uma ruptura de linguagem, mas com continuidade poética”. Depois de 8 anos a fazer vários projectos em várias cidades, Alexandre Farto criou um labirinto de imagens e de sons que agora ocupa a sala oval. São projeções de vídeo captadas em nove grandes cidades – Cidade do México, Cincinnati, Hong Kong, Lisboa, Los Angeles, Macau, Paris, Pequim e Xangai – em planos diferentes que se vão entrecruzando. No meio do labirinto, sentem-se as várias cidades, fazemos parte delas, observamos as pessoas. Num trejeito quase voyeurista, observamos as pequenas, ou nenhumas, diferenças que existem entre uma cidade na Europa, na Ásia ou na América. Para Vhils, “este processo de introspecção criativa espelha o avanço desmesurado das forças da globalização, que nem a aparente estagnação dos últimos dois anos conseguiu travar, sendo também uma reflexão sobre a crescente homogeneização das nossas sociedades: da perda de identidade em contextos urbanos e da complexidade dos desafios que enfrentamos hoje em dia. Uma afirmação sobre a igualdade, uma celebração da individualidade, e por fim, um apelo à unidade.” Os lugares, os espaços e as pessoas são-nos apresentados a 2000 frames por segundo, com sonoplastia de Chullage, e não precisamos mais do que 5 minutos para nos imiscuirmos neles.
Também com um toque de Alexandre Farto, mas como curador juntamente com António Brito Guterres e Carla Cardoso, é-nos proposta a exposição Interferências – Culturas Urbanas Emergentes. Na apresentação à exposição, João Pinharanda referia-se à mesma como “pioneira no olhar sobre a criação que é ignorada e que não teve lugar ainda nos espaços de museus.”
Integrando as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, que se iniciam já em 2022, a exposição Interferências aborda não os 48 anos de fascismo, mas sim os 48 anos de democracia e de construção da Área Metropolitana de Lisboa. As culturas urbanas, e como estas contribuem para a cidade de Lisboa, são plasmadas nos manifestos, nas formas e nos números. Temos pontos de memória, como reportagens da RTP transmitidas em monitores, notícias e gráficos em contraste com as sensibilidades, memórias e homenagens protagonizadas por novos artistas que, nas palavras de João Pinharanda “têm de estar na História”. Não é uma exposição simples. Organizada por núcleos, aborda vários temas e gera diálogos entre o palco e os seus actores. Com os temas “Contra a Mudez das Palavras”, “Coerção, Resistência e Identidades”, “Desenho de Cidade Comum, Nós por nós e Cidade Rede”, “Direito ao Imaginário” e “Padrão” somos confrontados com linguagens e temas que terão de marcar o debate quando se fala de Lisboa e da Área Metropolitana de Lisboa, da cidade e da periferia. Há uma cisão no formalismo que costuma habitar as paredes institucionais de um museu, e essa mesma cisão traz-nos o desconforto necessário para que entremos no debate. O dinamismo desta exposição não se resume obrigatoriamente à diversidade da obra exposta das dezenas de artistas que a integram, mas sim às realidades muitas vezes esquecidas dos 5/6 da população da AML que vivem na periferia.
Esta exposição colectiva não irá extinguir-se na apresentação das obras. Haverá a reinterpretação do Painel do Mercado do Povo, que irá juntar 12 sobreviventes dos 48 artistas do Movimento Democrático dos Artistas Plásticos, que pintaram o Mural de 10 de Junho de 1974, a mais algumas dezenas de participantes, entre os quais Petra Preta, ±MaisMenos±, Vhils, entre outros. Para 10 de Junho, haverá também programação Iminente, complementando as propostas de artes visuais das exposições Interferências e Prisma, bem como do próprio mural.
Continuando a linha da anterior direcção, a exposição Naturezas Visuais é o resultado de um trabalho de investigação que vai delineando o percurso das alterações climáticas e que dá continuidade à exposição Earth Bits, que esteve no MAAT em 2021. Mantendo o museu como um espaço aberto, virado para o mundo e virado para o questionamento, a exposição Naturezas Visuais mantém alguns elementos da exposição anterior, que são acompanhados por uma Biblioteca do Clima e uma assembleia, desenhada pela arquitecta brasileira Carla Juaçaba, onde se poderá navegar por conteúdos multimedia, percorrer gráficos e relembrar acontecimentos que tiveram impacto no ambiente.
O MAAT dá assim um passo muito sólido para se reafirmar como museu inclusivo e aberto. Um museu como espaço de reflexão e não apenas de contemplação. Um espaço que nos poderá trazer desconforto e estranheza, mas que nos educa e nos coloca ao lado do artista, e não apenas à frente da sua obra.