Literatura: 10 melhores livros que lemos em 2017

por Comunidade Cultura e Arte,    6 Janeiro, 2018
Literatura: 10 melhores livros que lemos em 2017

Em 2017 muitos livros foram publicados, e a CCA fez críticas a 43 deles. Aqui estão aqueles que considerámos ser os 10 melhores livros lidos por nós, dos lançados entre os dias 1 de Janeiro e 31 de Dezembro do ano passado (sim, porque já estamos em 2018).

Viagem ao Sonho Americano, de Isabel Lucas

Todas as narrativas acerca dos Estados Unidos da América acabam inevitavelmente por ir dar ao Sonho Americano, a noção de que um futuro próspero está à tua frente se te esforçares e trabalhares no duro. De que, não importa o teu passado, para poderes prosperar no país de todas as possibilidades. Inegavelmente ligada à ideia de migração, uma saída do local onde crescemos, em direcção a uma terra desconhecida, à procura de sucesso, o Sonho Americano está na fundação daquele que é, ainda hoje, provavelmente o mais poderoso país do mundo.

Isabel Lucas, jornalista do jornal Público,esteve durante cerca de um ano a viajar por este país, num projecto apelidado A América pelos Livros, consistindo numa reportagem por cada um dos doze meses do ano dedicada a uma geografia específica do país, partindo de uma obra literária que a esta geografia estivesse associada. Esses doze artigos, reportagens com sabor ensaístico, foram agora agrupadas e publicadas em formato livro com o nome de Viagem ao Sonho Americano, pela Companhia das Letras, juntando, aos textos publicados no Público (o primeiro no dia 1 de Maio de 2016, o último dia 2 de Abril de 2017), pequenos apontamentos ao longo da viagem, em jeito diarístico, que encerram, em poucas frases, pensamentos e relatos de Isabel Lucas em relação ao que se vai passando no seu dia-a-dia (ler mais)

As Últimas Testemunhas, de Svetlana Alexievich

Svetlana Alexievich(n. 1948), Prémio Nobel de Literatura 2015, continua a registar a história da União Soviética utilizando as vozes das vítimas. Mais do que uma análise da macroestrutura das condições políticas, ou da exegese biográfica dos protagonistas, a escritora nascida em Minsk dá espaço para as vozes das pessoas se fazerem ouvir. Enquanto o historiador olha para o global, para esses grandes acontecimentos e grandes personagens, Svetlana olha para o pormenor, para o aldeão, para a criança, olha para quem a tragédia foi muito mais do que algo abstracto.
“As Últimas Testemunhas – cem histórias sem infância”(Elsinore; trad. Galina Mitrakhovich) mantém a estrutura de livros como“Vozes de Chernobyl”,“Rapazes de Zinco”, ou“A Guerra Não Tem Rosto de Mulher”.
O combate do exército soviético no Afeganistão, entre 1979 e 1989, foi o “leitmotiv” de“Rapazes de Zinco” (ler mais)

Políticas de Inimizade, de Achille Mbembe

Aos olhos do Ocidente, a história de África (mas também da América) começa com o Colonialismo, a partir do séc. XV, que aos olhos dos colonizadores, era responsável por trazer África (e a América) para o mundo, ignorando os milhões de Homens que já viviam nesses continentes, com a sua própria história, aniquilados, quando não escravizados, pelos colonizadores. Só no século XX, com as Guerras de Libertação Nacional, estes povos subjugados se conseguiram soltar das amarras do colonialismo que, entre outros, tinha trazido a escravatura e a discriminação.

Essa nova independência e liberdade não viria, no entanto, a resolver todos os problemas causados ao longo de cinco séculos, que haviam deixado graves fissuras nos colonizados. Porque, se se pode dizer que a escravatura foi efectivamente abolida e é repudiada pela grande maioria dos ocidentais de hoje, os estragos que causou não foram apagados simplesmente pela mesma ter deixado de ser imposta, já nem referindo os séculos de trabalho forçado que se seguiram. Num mundo pós-colonial, onde os povos colonizados conseguiram finalmente auto-administrar-se através de estados independentes, a memória do que se passou e, mais do que isso, as suas consequências, ainda estão inteiramente presentes quer na vida Ocidental, quer, essencialmente, na dos povos anteriormente colonizados (ler mais)

O Vendido, de Paul Beatty

Sentado no Supremo Tribunal Americano, o personagem Me, um afro-americano criado no gueto de Dickens, cidade fundada com o intuito de ser “livre de chineses, espanhóis de todos os tons, dialetos e chapéus, franceses, ruivos, citadinos e judeus sem qualificações”, acende um charro enquanto espera para ser julgado no que ele considera ser mais um caso racial nos Estados Unidos da América. Me é acusado de esclavagismo (tem um escravo que não quer deixar de ser escravo) e de reinstalação da segregação racial.

O desconcertante início de“O Vendido”(Elsinore) promete o que virá ser cumprido:
Paul Beatty(Los Angeles; 1965) escreveu o romance mais “badass” que o leitor vai ter nas mãos este ano.
É entre juízes, advogados e réus, que Me conta que a sua motivação visava o bem comum. Sem o racismo, a comunidade perdeu a sua dinâmica e as pessoas ficaram “perdidas”. Onde encontrar novas causas e novas bandeiras? (ler mais)

As Veias Abertas Da America Latina, livro de Eduardo Galeano

Nos últimos anos, na generalidade dos países da América Latina, esforços tinham sido feitos para devolver o poder à população e melhorar as suas condições de vida, nomeadamente com o intuito de tirar de lá os muitos que estavam embrulhados na pobreza e na fome. A chamada ‘onda rosa’, que, desde o final dos anos 90 do século passado, levou ao poder diversos governos com programas baseados em políticas reformistas de esquerda, partia essencialmente duma premissa comum (obviamente com as devidas diferenças internas): opor-se às directrizes políticas e económicas impostas pelos Estados Unidos da América e pelo Fundo Monetário Internacional, controlado em grande parte pelos Norte Americanos. Lula da Silva, no Brasil, Évo Morales, na Bolívia, Hugo Chávez, na Venezuela, Néstor Kirchner, na Argentina, entre muitos outros, trouxeram ao país a esperança da reversão de séculos de subjugação da população dos seus países, procurando inspiração em nomes como Símon Bolívar e Salvador Allende, este último morto durante o Golpe de Estado financiado pelos EUA que pôs Pinochet no poder no Chile (ler mais)

Octaedro, livro de Julio Cortázar

Orientar o leitor até ao sentido, dispensando o esforço de quem recebe o texto, é algo rejeitado por escritores como Jorge Luis Borges, ou Edgar Allan Poe.Julio Cortázar (1914-1984), influenciado por estes dois escritores, construiu narrativas que exigem do leitor redobrada atenção. O escritor argentino dá liberdade e pede responsabilidade, num jogo literário que depende da participação de quem decide caminhar por esta teia construída de forma exemplar. A Cavalo de Ferro continua a publicar a obra do autor de O jogo do mundo – Rayuela. Surge agora um dos últimos livros do escritor,Octaedro,publicado em 1974, mas inédito em Portugal até agora (ler mais)

Nossos Ossos, livro Marcelino Freire

Valter Hugo Mãe, no prefácio a Nossos Ossos, introduziu Marcelino Freire como o “(…) mestre.(…) um escritor de maravilha, na esteira dos maiores do seu país, na esteira dos maiores da língua portuguesa” e terminou, afirmando: “Não dá medo ler Marcelino Freire. Dá juízo”. Iniciamos uma espécie de ritual de preparação para o que se aproxima e antevemos; respiramos de modo profundo, porque nos iremos embrenhar (ou embater?) no colosso literário que Valter Hugo Mãe nos promete. Porém, falhámos redonda e inegavelmente. Qualquer preparação não terá sido suficiente. A violência, a angústia e a individualidade de Nossos Ossos impõem-se como um percurso, uma luta. Temos de suspender a leitura para recomeçar com outro fôlego. Imbuímo-nos em Heleno Gusmão, bebemos do seu amor a Cícero, também referido como oboy. Uma viagem visceral, sem dúvida (ler mais)

O teu rosto amanhã (I), livro de Javier Marías

Ao longo dos seus já treze romances (e outros tantos livros de contos e colectâneas de crónicas e artigos), o narrador de Javier Marías parece ser sempre o mesmo. Com as devidas variações de um livro para o outro, o seu trabalho incide sempre em algo que lide com interpretar o outro, seja através de traduções ou subtextos, ou sendo um escritor fantasma (vulgo ghostwriter) ou até mesmo um intérprete de ópera. Acima de tudo, o narrador de um livro de Javier Marías parece-se com o próprio, como se, no fundo, cada romance fosse sempre narrado pelo autor (até pela similitude dos temas de livro para livro), que vai variando os traços biográficos do narrador ficcionado, mas que os mantém sempre próximos uns dos outros e, consequentemente, de si mesmo, numa mistura entre ficção e biografia que o autor nos engana (ler mais)

Podes também ler a crítica ao segundo volume aqui.

Apanhados pela Revolução, livro de Helen Rappaport

O livro de Helen Rappaport não é, certamente, único e, por certo, não será o último de uma lista, sem surpresa, longa. Mas traz algo mais à enorme torrente de bibliografia sobre as revoluções de 1917 de Fevereiro e Outubro. Para se perceber de que forma o estudo desta historiadora pode trazer um contributo valioso e singular, basta percorrer as oito páginas ocupadas pelo «Glossário de Testemunhas Oculares». Entre jornalistas, estudiosos, activistas e diplomatas, há, nesse elenco, profissionais de saúde, aristocratas, artistas, mas também cidadãos sobre os quais pouco ou nada é possível saber. Todos eles, no entanto, têm algo em comum: estavam em Petrogrado antes, durante e/ou depois das revoluções de 17. E deixaram marcas e testemunhos, escritos ou relatos por interposta entidade. Vislumbres que permitem ao leitor, à distância de um século exacto, acesso à impressão recolhida in loco (ler mais)

A Porta, de Magda Szabó

Inegavelmente, ou não teriam como fazer o seu próprio trabalho, as empregadas domésticas, ou criadas, como eram em tempos chamadas, são das poucas pessoas com acesso à nossa privacidade. O nosso lar, vedado a tantos, é lhes aberto, entram em nossa casa, limpam aquilo que sujamos, arrumam aquilo que desarrumamos, às vezes cuidam até dos nossos filhos, ou, se trabalharmos em casa, até acesso aos nossos hábitos de trabalho têm. O privilégio que, à partida, nos dá a possibilidade de poder ter uma empregada doméstica, acaba por nos colocar numa posição de condescendência em relação à pessoa a quem delegamos aquilo que consideramos de menos importância, não por não precisarmos que seja feito, mas por não termos como ser nós a fazê-lo, quer por julgarmos ser bons demais para isso, quer meramente pela impossibilidade de conciliar tais actividades com a vida profissional (ler mais)

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