“Da Linha”, de PEDRO, é um álbum fácil de se ouvir mas difícil de se recordar
Ainda é cedo para sabermos o lugar definitivo dos Buraka Som Sistema na história da música portuguesa, mas qualquer prognóstico augura um estrelato invejoso. Foram os primeiros verdadeiros impulsionadores desta “Nova Lisboa” hoje cantada por, entre outros, Dino D’Santiago, permitindo que esse sonho português passasse a realidade internacional, através da sua electrónica global. No cerne das suas batidas infeciosas, está a produção musical de Branko, que viria a encantar fãs e a inspirar vários músicos, entre os quais se destaca Pedro Maurício, artista lisboeta mais conhecido como PEDRO.
Depois de colaborações em projectos de Dino D’Santiago e Carlão, temas com Pedro Mafama e com o próprio Branko, o artista da Enchufada lança agora o seu primeiro longa-duração, Da Linha. Torna-se claro desde o início que Maurício não se afasta da herança dos Buraka Som Sistema: “Rapazes” abre o álbum com um sample do grupo português, um tema entusiasmadamente ameaçador e um bom presságio do serão de dança e ritmos efervescentes que se avizinha. Mas ainda que a estrada de ambos os projectos seja a mesma, é perceptível que PEDRO está noutra faixa.
“Calores” assume-se como algo à parte do que veio antes. Ouvimos uma espécie de acordeão electrónico a dar o mote e a melodia soturna, que parece cantada por um robô com falta de ar, alia-se a uma pista de dança vertiginosa, com variados timbres de percussão que se unem para criar loops que não cansam. Há muita coisa a acontecer, encapsulado numa atmosfera de brisa de verão que suspira praia e daiquiris. Já “Madrugada” assume-se como um club banger ao qual não ficamos indiferentes, que peca pela sua curta duração e alguma perda de rumo ao fim do primeiro refrão intoxicante.
Ainda que as semelhanças com o passado existam — especialmente vincadas em “Terra Treme”, tema com uma prestação vocal taciturna e apaixonada de Pedro Mafama — é pelas diferenças que o trabalho de PEDRO se destaca. Nota-se uma tendência oriental marcadamente sua, distinta do que a precedeu. “Pusha” mostra, através da sua melodia de sopro, outro tipo de internacionalização e consegue eficazmente mudar a atmosfera, trazendo-a de volta ao que é mais familiar no trabalho deste músico. “Toques” aposta também nesta vertente, com mais uma melodia sibilante conjugada com bombos expansivos. São dois exemplos da versatilidade de PEDRO, sem medo de beber das músicas do mundo para acrescentar originalidade e critérios às suas.
No entanto, Da Linha é um pequeno passo na direcção certa e não o apogeu musical de PEDRO. Ao fim de algumas audições, o valor de repetição do álbum deixa a desejar. “Takré” mostra discípulo e Miyagi unidos numa dança quente e pluripotente, uma simbiose artística poderosa que denota alguns dos trunfos melódicos do convidado Branko, aqui aplicados à fórmula de PEDRO. Mas é uma ideia que beneficiava de mais tempo de maturação. “Too Much” torna-se cansativa, fruto da repetição vocal e timbre pouco flexível de Magugu, aspectos que também se alastram para o instrumental. “Para Ti” transporta-nos para terras tropicais, mas para uma enseada mais batida e cheia de gente, e não para aquele pedaço de terra escondido e único, viagem algo genérica que não justifica um lugar de destaque na vaga latina que cada vez mais toma conta do mainstream musical.
Da Linha é um álbum fácil de se ouvir mas difícil de se recordar. Mostra que PEDRO continua numa trajectória cada vez mais sua, mas nunca justifica verdadeiramente o seu talento. Dá para dançar a quarentena, mas não servirá de memória destes tempos quando o papão viral não for mais do que uma má recordação.