A turbulência vivida e sentida por Sylvia Plath
Pese embora as dificuldades emocionais e mentais com as quais se deparou, Sylvia Plath afirmou-se como um dos grandes nomes da literatura do século XX. Tanto numa extensão textual em que os parágrafos dominavam como noutra em que as estrofes davam vida às palavras, a norte-americana acresceu o sentimento intenso e a visão única que possuía pelos pormenores que a circundavam. Pouco foi o que ela deixou por não escrever, especialmente no que toca às lides do coração e particularmente na vertente poética. É por isso que, de forma tão própria e singular, nunca se esvaiu com o passar dos anos, permanecendo bem presente para a compreensão daquele que se vê na exaustão.
Sylvia Plath nasceu a 27 de outubro de 1932 nos arrabaldes de Boston. A autora começou bem cedo a redigir a sua predileta poesia, começando com somente oito anos e publicando-os na secção infantil do periódico Boston Herald. No entanto, também se destacava na poesia, conquistando até um galardão com 15 anos da instituição The Scholastic Art & Writing Awards. A morte precoce do seu pai fê-la cair em descrença no que toca aos preceitos cristãos. Foram momentos agónicos como este que lhe acrescentaram corpo para produzir a poesia que a acompanharia até ao final da sua vida. Tanto a nostalgia pela infância como as vicissitudes que lhe seguiram o trilho foram temas dominantes da sua poesia. Emaranhando-se num estado depressivo, do qual sempre foi refém, tentou suicidar-se pela primeira vez aos 21 anos, altura em que a vida profissional se revelou sisuda para com a escritora. Também os hospitais psiquiátricos nunca foram alheios aos episódios sucessivos da sua caminhada pelo mundo, este que tanto a atormentava.
Apesar destas intempéries, Sylvia conseguiu completar os seus estudos com distinção em 1955, na Smith College, em que redigiu uma tese sobre Dostoievski. Na sua prossecução, estudou também em Cambridge, publicando as suas produções poéticas no jornal universitário Varsity. Foi numa festa na cidade britânica que conheceu o amor da sua vida, o poeta Ted Hughes. Corria o mês de fevereiro de 1956. Quatro meses depois, os dois literários casaram-se em Londres e, um ano depois, seguiram de malas e bagagens para o país de Sylvia. Esta, assumindo as responsabilidades profissionais que os vários postos de emprego pelos quais passou lhe incutiram, tornou-se numa autora mais dedicada e focada. Foi nesta abordagem que se tornou numa escritora essencialmente confessional, em que o seu único romance foi escrito com um pseudónimo (Victoria Lucas) e em que este assume um caráter parcialmente autobiográfico. O nome atribuído à obra foi “The Bell Jar” (1962), escrita com o intuito de se libertar de um denso passado que remanescia no seu delicado subconsciente. No entanto, esta não foi a primeira a ser publicada, tendo a sua coleção de poesia designada “The Colossus” (1960). A outra compilação seria publicada postumamente (“Ariel”, de 1965), pois a norte-americana optou por acabar com a sua vida em 1963, aos 30 anos de idade. A 11 de fevereiro desse ano, Sylvia Plath não aguentava mais as agruras que se acumulavam no seu percurso e, culminando na fragilidade física dos seus dois filhos, acabou vítima da depressão que a assombrou nas três décadas da sua curta vida.
A sua notoriedade enquanto autora chegou somente após a sua morte, em que os componentes de “Ariel”, associados aos contornos da sua morte, despertaram o interesse dos críticos e daqueles a quem passara despercebida. O desespero sentido e a vontade de findar com a sua experiência no mundo foram temas reiterados nas várias estrofes constituintes de tão rica mas agonizante obra. Foi também a exportação da obra para as massas que despertou o interesse daqueles que defendiam a causa feminista. Muitos destes destacaram a força de caráter e o poder da mensagem que um conjunto de palavras desencadeadas por emoções profundas e intrínsecas transportava. Outros temas dominantes da sua poesia prendiam-se com a Natureza e com a sua beleza e correlação com os detalhes humanos, descrevendo amiúde paisagens e locais emblemáticos na sua estima. Contudo, é pelo sentimento que é louvada a poesia da norte-americana, expressando todo o desespero, o desejo de vingança e também o amor que a acompanhavam no seu músculo bombeador. Residia na competência da escritora na atribuição de um caráter funesto aos pormenores do quotidiano e no crescente confessionalismo da sua obra os dois braços de um corpo de poesia profícuo numa beleza surrealmente melancólica. Ainda e sempre na poesia, Sylvia viria a arrecadar um Pulitzer póstumo (1982). A isto se complementam os artigos que escrevia regularmente para vários jornais e as cartas que ia redigindo, nunca deixando a desejar à intelectualização da sua formação.
A autora, que partiu há 53 anos, permanece bem presente e implicitamente premente numa sociedade em que os suicídios ainda constituem grande parte das manchetes dos periódicos. A norte-americana deu corpo textual a essa questão como mais ninguém o fez, afirmando-se com um lirismo particular e devoto à causa sobre a qual escrevia. Causa essa que se tratava da turbulência que tornava o seu coração mais pesado, resultante esta do seu passado e da sua fragilidade mental e emocional. Sylvia Plath foi poeta para si mesma, querendo exorcizar os fantasmas do seu passado e minorar as aflições de um presente onde não vivia mas sim sobrevivia. No entanto, tornou-se ícone bem longe dos seus momentos de aperto e de sofreguidão, acabando louvada e idolatrada pelos adeptos da poesia como momento e sentimento. Sylvia cumpriu-se na sua obra, onde a sua vida se completa e se eterniza e onde o seu coração encontra o merecido descanso na suavidade da fidelidade.